O dia 1º de Maio é o verdadeiro dia do contrato social que liga a sociedade portuguesa. Que me perdoem os admiradores de Camões, grupo do qual também faço parte, do fado, do futebol e de tantos outros sinais da nossa identidade colectiva nacional. Todos têm um papel no imaginário daquilo que é Portugal e a portugalidade. Ao contrário de outros dias que relembram vencedores políticos ou credos religiosos e que, nessa medida, não são universais, o 1º de Maio é a pedra basilar do modelo de sociedade que temos e que queremos ir aperfeiçoando.

O Dia do Trabalhador, que noutras latitudes se comemora noutras datas, celebra a conquista do direito dos trabalhadores a uma jornada de trabalho que fosse compatível com o exercício de cidadania e com a família, entronizando a jornada de oito horas por dia e um dia de descanso semanal. Este pedido singelo, num tempo em que as jornadas de trabalho se eternizavam, sem descanso razoável, primeiro foi recebido a tiro pelas forças da ordem, depois com julgamentos e enforcamentos. Foi assim em 1886, em Chicago e noutras cidades nos EUA.

Na altura, apenas se pedia aquilo que era justo, mas foi com sangue, suor e lágrimas que os trabalhadores, organizados em torno de estruturas sindicais, conseguiram aceder à dignidade do trabalho e da pessoa humana, e a um contrato social em que os ganhos passaram a ser repartidos de forma minimamente justa entre os trabalhadores e os detentores do capital.

Alegar que o 1º de Maio é uma comemoração marxista não tem qualquer respaldo, aliás como não tem qualquer sustentação dizer que se trata de uma comemoração típica de regimes autoritários, que exibem a sua força em paradas para impressionar a opinião pública. Uns e outros celebram o 1º de Maio, ou ‘usam’ o 1º de Maio, mas esta data vai muito para além disso.

O 1º de Maio é também o Dia do Trabalhador para a Igreja Católica, ou para os regimes democráticos. Diria que, no caso das sociedades democráticas em particular, o 1º de Maio é o símbolo por excelência do contrato social que lhe está implícito, do respeito pelo esforço, pelo mérito e pelo engenho.

Todos sabemos como este contrato social está ameaçado pela digitalização, pelas economias de partilha que deixam na mão de poucos o que a muitos pertence, pelas empresas que não criam postos de trabalho, não pagam Segurança Social ou impostos nos países onde fazem negócios.

O 1º de Maio é um dia de celebração para todos aqueles que vivem do seu trabalho, ou das suas reformas, que também são fruto do seu trabalho.

Este é igualmente um dia de celebração para os sindicatos independentes e para os seus sócios, como é o caso dos sindicatos que integram a União dos Sindicatos Independentes (USI), Central Sindical que há 18 anos pugna pelo acesso ao Conselho Económico e Social da República Portuguesa.

O 1º de Maio é um dia de celebração para aqueles que fazem erguer a sua voz, mesmo que não estejam alinhados à volta de lógicas partidárias, ou de terra queimada. Alguns observadores gostam de fazer crer que o sindicalismo é apenas isto, ou essencialmente isto. Não é verdade. O sindicalismo independente não é nada disso. Que fique muito claro: a grande maioria dos trabalhadores em Portugal não se revê nesse tipo de orientação sindical.

O verdadeiro dia de Portugal e dos portugueses é o Dia do Trabalhador, e o 1º de Maio é o dia por excelência do grande contrato social que sustenta a nossa vida comum.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.