Fala-se muito da quinta geração da tecnologia móvel, o sistema 5G, como pilar da transformação digital. Trata-se de uma verdadeira revolução tecnológica que permitirá o diálogo e a tomada de decisões pelos objetos conectados, que ganharão protagonismo em relação às comunicações pessoais que protagonizam a atual geração 4G.

Até à data, a evolução das telecomunicações móveis esteve quase totalmente centrada à volta das necessidades associadas aos sentidos humanos, através de serviços de voz, texto, navegação e vídeo, que foram os protagonistas das quatro gerações anteriores.

Mas antes de consolidar a transcendental evolução para a tecnologia 5G, em que as capacidades prescritivas das máquinas lhes permitirão comportamentos artificialmente inteligentes, seria desejável consolidar uma 4G dos direitos humanos que nos proteja desta nova e inexorável realidade.

De forma simplificada, cada um dos três séculos anteriores tem sido protagonizado por uma geração dos direitos humanos. A primeira, que começou no século XVIII, centrou-se na “liberdade” das pessoas e nos seus direitos cívicos e políticos. A segunda geração esteve mais focada nos direitos económicos e sociais que procuravam a “igualdade”. E a terceira geração, já no século XX, procurou a justiça, a paz e a “solidariedade” entre as pessoas.

A quarta geração dos direitos humanos deveria proteger-nos dos riscos de “coisificação” inerentes a estas novas tecnologias, que estão mais pensadas para as comunicações entre as coisas que entre as pessoas, à diferença das gerações anteriores. Direitos como o esquecimento e a desconexão; a identidade e o legado digital; a transparência, a segurança e a imparcialidade dos algoritmos; ou o consumo e a igualdade de oportunidades económicas digitais não são minimamente considerados no desenvolvimento do enorme potencial tecnológico do 5G.

Com a informação de que hoje já dispomos sobre as capacidades do 5G e das tecnologias associadas, é possível começar a antecipar o seu impacto e proteger-nos contra um novo mundo possivelmente orwelliano. Neste momento, a dificuldade não reside em predizer o futuro, mas em gerir as mudanças necessárias para nos proteger dele.

O otimismo ou o pessimismo passa a ser irrelevante neste contexto. Não se trata de especular sobre o futuro e tentar adivinhar se o impacto da tecnologia acabará por ficar mais próximo do pessimismo inicial dos humanistas ou do triunfalismo dos tecno-otimistas. É preciso objetividade e pragmatismo para interpretar o impacto social da digitalização, preparar-nos para gerir os cenários mais prováveis e liderar de forma possibilista a irreversível mudança.

Nessa base, para materializar a atualização dos direitos fundamentais, será preciso recuperar a importância dos cientistas sociais e do resto das disciplinas humanistas, que tratam precisamente das matérias que, em número cada vez mais reduzido, nos separam das máquinas.

E também recuperar a importância da filosofia porque as situações de incerteza, agora provocada por esta singularidade tecnológica, sempre foram melhor enfrentadas pelos filósofos, treinados precisamente para pensar com clareza nos cenários de maior complexidade.