O diagnóstico está feito e resulta de um notável trabalhado realizado pela OCDE que contou com o apoio da CMVM. Já sabíamos que a situação é muito preocupante mas o confronto do nosso mercado de capitais acionista com os demais mercados europeus não deixa de impressionar pela negativa, é claro.

Parte do trabalho da OCDE, no seu “Survey on Access to Finance in Portugal”, passou pela auscultação das empresas quanto ao acesso a financiamento.

As empresas que estão a considerar recorrer ao mercado acionista para se financiarem invocam como principais razões que as levam a não avançar com o IPO a complexidade regulatória, os custos elevados inerentes ao cumprimento das regras de corporate governance e compliance e a falta de liquidez do mercado em Portugal. A estas razões acrescem outras como por exemplo a morosidade do processo de IPO e a existência de custos superiores ao esperado. As razões invocadas pelas restantes empresas são sensivelmente as mesmas com exceção daquela que é a principal razão invocada: o desejo dos acionistas não partilharem o controlo da sociedade com novos investidores.

É preciso fazer um novo esforço coletivo urgente para atuar sobre esta realidade, seja para desmistificar a perceção relativa a algumas das razões invocadas, seja para ajustar os obstáculos e criar incentivos ao recurso ao mercado acionista.

O estudo da OCDE contem diversas recomendações, tendo também solicitado às empresas auscultadas sugestões para a dinamização do mercado acionista.

Partilhando esse exercício, diria que, em primeiro lugar, há que aproveitar as empresas que ainda são cotadas e dar-lhes incentivos para continuarem a recorrer ao mercado, reforçando mesmo a sua presença. Há muito que pode ser feito a este respeito, começando pela simplificação do processo de realização de ofertas por empresas já cotadas: estas estão sujeitas a deveres permanentes de divulgação de informação relevante e isso deve ser tido em conta na realização de aumentos de capital.

Boa parte dos incentivos que podem ser implementados para convencer as empresas a permanecer no mercado terá efeitos benéficos naquele que deve ser o outro objetivo principal na missão de renascimento do mercado acionista: o aumento do número de empresas que a ele recorrem.

Também neste particular são muitas as ferramentas a que o legislador pode recorrer, desde logo um pacote fiscal bem pensado e que seja uma resposta efetiva e ajustada às necessidades das empresas. Medidas fiscais, como a equiparação do tratamento fiscal entre a dívida e os capitais próprios, a atribuição de créditos fiscais transmissíveis relacionados com os custos de realização do IPO ou os custos permanentes inerentes ao recurso ao mercado acionista, a criação de incentivos fiscais ao investimento em ações, em particular por parte dos investidores institucionais. Mas também medidas de natureza regulatório como, por exemplo, regimes especiais simplificados ou mais flexíveis para empresas de menor dimensão ou prazos alargados para aplicação de determinadas exigências.

Uma das ferramentas mais interessantes ao dispor do legislador são os Special Purpose Acquisition Vehicles ou SPAC, figura cuja introdução em Portugal é recomendada pela OCDE e que está neste momento a ser uma das principais formas de trazer empresas para o mercado acionista, em particular nos Estados Unidos da América.

Trata-se de um modelo híbrido, que combina investimento em instrumentos admitidos à negociação em mercado com investimento em outros instrumentos, configurando-se como uma alternativa ao processo tradicional de IPO, com vantagens não apenas para as empresas que a elas recorrem mas também para os gestores de fundo de capital de risco nacionais.