Teve lugar no dia 14 de junho em Bruxelas mais uma cimeira da NATO. Emergiram do debate três temas merecedores de uma especial atenção. O primeiro, prende-se com a reafirmação do empenho americano com a Aliança e com a segurança dos seus aliados europeus. Essa “responsabilidade” aparentemente desvanecida durante a Administração de Trump (nunca foi necessário testá-la) é retomada com grande fulgor.

Como se alguma vez tivesse saído de cena, é agora anunciado o “regresso da América” (America is back), um alegado regresso destinado a restaurar o projeto de supremacia global, que teria sido posto de parte durante a Administração do presidente Donald Trump.

A NATO, assim como o G7 e outros fora, serve esse propósito hegemónico. Como se tratasse de um clube, insere-se numa forma de multilateralismo, na qual os Estados europeus são atores secundários, subordinados a um projeto dominante que colide com o seu próprio projeto, que pugna por tornar a União Europeia um verdadeiro ator geopolítico, dotado de autonomia estratégica, inicialmente concebida apenas no domínio da segurança e defesa, mas que se alarga hoje a outros domínios.

O segundo tema prende-se com a importância atribuída à China. Enquanto a Rússia e o terrorismo foram apresentados como ameaças diretas à segurança da Aliança, a China foi objeto de considerações menos assertivas. O aumento da sua influência internacional e das suas políticas externas “podem apresentar desafios que necessitaremos de encarar conjuntamente como uma Aliança”.

Note-se que foi apresentada como um desafio e não como uma ameaça. Para isso terão contribuído os UE-3 (Alemanha, França e Itália) que não querem ser arrastados para uma Guerra Fria contra a China, por não considerarem Beijing uma ameaça militar à Europa. Terá ficado claro na Cimeira não existirem garantias de se conseguir constituir uma aliança ocidental contra a China. Afinal, a relação da Europa com a China não se limita a assuntos de segurança e defesa.

O terceiro tema tem a ver com a mimetização da linguagem empregue por Washington no comunicado final da Cimeira, que nos apresenta a Aliança como um “soldado” no combate travado pelas democracias contra as potências autoritárias. Ora, apresentar as relações entre Estados, grandes potências em particular, como lutas maniqueístas do bem contra o mal, além de ser simplista é perigosa, porque está longe daquilo que verdadeiramente motiva a ação dos Estados na cena internacional.

Pode tentar-se, com essa abordagem, fingir que não se atribuiu importância à geopolítica, mas essa postura não passa de uma diversão, porque em última análise o que motiva e explica o comportamento das grandes potências na arena internacional é o poder, e não as cruzadas éticas para instaurar a democracia.

É bom sublinhar que a NATO é um projeto geopolítico, e é nesses termos que deve ser vista e as suas ações interpretadas. É inútil tentar vê-la de outro modo. Talvez esta abordagem nos torne mais nítidos certos acontecimentos, como, por exemplo, a intervenção militar na Líbia, os recentes desenvolvimentos na Ucrânia, ou a complacência com o comportamento perturbador da paz e da segurança internacional por parte da Turquia. Podemos dar muitos outros exemplos.