Há cerca de dez anos, Mario Draghi disse de forma determinada que “tudo seria feito para salvar o euro”.
A União Económica e Monetária (UEM) passava por um período difícil, confrontada com uma inédita crise da dívida que colocou a moeda única em risco. O mercado acreditou no BCE e em Draghi. A credibilidade da instituição mereceu o benefício da dúvida e o então presidente do Banco Central Europeu (BCE) conquistou uma reputação que o levou posteriormente à liderança do governo no seu país natal.
Na semana passada, o BCE decidiu subir os juros pela primeira vez em 11 anos. Christine Lagarde já o tinha avisado e o Banco Central estava a ser muito eficaz na comunicação antecipada do rumo da política monetária – o chamado “forward guidance”. Só que Lagarde tinha dito, com clareza, que a subida em julho seria de 25 pontos base. O BCE surpreendeu com o dobro, atirando para o lixo o “forward guidance” e minando a credibilidade do Conselho de Governadores.
Ao mesmo tempo foi anunciada uma nova ferramenta – o Instrumento de Proteção de Transmissão da política monetária, ou IPT – que pretende impedir o alargamento dos spreads entre as dívidas dos vários países, algo que se assemelha a um novo momento “whatever it takes” e que pode discutir-se se não será um passo em frente na solidariedade entre os bancos centrais da UEM.
Como a subida de 50 pontos era pretendida por alguns Governadores, nomeadamente dos países do centro da Europa, tudo parece ter sido um “negócio”: as taxas subiram mais para agradar a essa fação, mas, em troca, houve unanimidade em torno da nova ferramenta. Lagarde terá capitulado e acabou por anunciar uma decisão que contradizia o que antes tinha antecipado.
Os detalhes acerca do IPT foram muito escassos, o que, a par do abandono do “forward guidance” e da ideia de negociata entre os Governadores, contribuem para diminuir a reputação do BCE.
Num cenário de grande incerteza quanto à evolução da economia, em que a coesão da UE e da UEM é testada diariamente devido aos impactos da guerra, e em que Itália está ainda em pior situação em termos de dívida do que há dez anos, seria muito útil ter um BCE credível e com uma liderança forte.