Vivemos curiosos tempos na Europa. Sábado passado, na Bulgária, o presidente acusou o primeiro-ministro de “deriva mafiosa” e convidou-o a demitir-se, num país onde a corrupção se instalou. Na Polónia o Presidente Duda, ultraconservador, é reeleito por escassa margem. Nos últimos anos deu-se neste país um assalto à independência do sistema de Justiça, ataques sistemáticos à liberdade de imprensa e intimidações aos opositores.

Duda fica agora com um país dividido entre jovens (65% dos eleitores com menos de 20 anos votou Trzaskowski) e menos jovens (62% dos acima de 60 anos votou Duda); e entre meio urbano (onde 66,5% vota Trzaskowski) e meio rural (onde 63% escolheu Duda). Mas o mais importante é que a oposição polaca tem finalmente um líder, órfã que estava com a auto-exclusão de Tusk.

O Reino Unido fecha a porta à entrada de cidadãos europeus, o principal cavalo de batalha do referendo que ditou a separação da União Europeia, para agora a abrir a potencialmente três milhões de cidadãos de Hong Kong. São tempos orwellianos, quando o Ministério da Paz fazia a guerra, o Ministério da Verdade espalhava a mentira, o Ministério do Amor praticava a tortura e o Ministério da Abundância tratava da fome.

Mas o grande quebra-cabeças europeu, que vai marcar o nosso futuro imediato, joga-se no fim do ano, no congresso de dezembro da CDU em Estugarda, onde é escolhido o sucessor de Merkel.

Há seis meses em desgraça, a chanceler alemã, que os seus compatriotas consideram ter gerido a crise da Covid sem faltas, retomou a popularidade de outros tempos e tornou-se de novo a figura de referência da política germânica, a ponto de lhe ter sido perguntado abertamente na entrevista televisiva que deu à ZDF se se iria recandidatar às eleições de 2021. Respondeu “não”, mas muita água vai passar debaixo da ponte e na política a verdade é relativa.

Merkel falhou na tentativa de escolher o seu próprio sucessor, patente quando AKK se demitiu da liderança da CDU em fevereiro, depois de várias gafes. Merkel está, portanto, fragilizada neste domínio e Soder, líder da CSU, já marcou terreno – há pouco tempo declarou que “só os que demonstraram capacidade de gerir uma crise podem brilhar”, isto é, o tempo não está para amadores.

Perto de dois terços dos alemães consideram-no à altura do lugar, à frente das figuras do seu parceiro: Merz, com um terço de opiniões favoráveis na sondagem ZDF, Rottgen, com apenas 14%, Laschet, o primeiro-ministro da Renânia do Norte, o mais próximo de Merkel mas enfraquecido por ter confinado depressa de mais, e Spahn, o ministro da Saúde, bastante mais à direita.

Com Soder nada será como dantes – crítico de Merkel, com ele teremos uma Alemanha mais centrada em si própria e uma União menos coesa. Contra si tem a CSU ter perdido a maioria absoluta na Baviera, que vai querer recuperar em 2022. Vamos ver se vai tentar atravessar o seu Rubicão.