1. Arrendar um quarto em Lisboa custa 300 euros, mas o Governo vai querer colocar apartamentos de renda acessível por quantias módicas que poderão estar nos 100 euros de média. Como fazer? Como é óbvio, será o contribuinte na sua generalidade a pagar mas, ainda assim, é preciso puxar pela imaginação para ir buscar rapidamente espaços num período em que se está a menos de dois meses das eleições autárquicas.

Estará para sair um diploma que vai permitir às Câmaras Municipais impor o arrendamento (forçado) junto dos proprietários (integrado na Lei de Bases da Habitação).

Aqui chegados é fácil concluir que estaremos perante mais um imbróglio que será criado pelo Governo, pois a lei já permite a expropriação por interesse público. Mas aqui será uma quase expropriação por um interesse privado, na medida em que o objetivo é ocupar as habitações por privados e sobre as quais nem sequer há garantias.

As rendas médias em Lisboa e arredores, e que se dirigem a famílias ou singulares de recursos médios, não têm, efetivamente, condições para baixar.

Podemos atribuir o fenómeno às taxas e impostos, à falta de garantias dos inquilinos que destroem as habitações, aos elevados preços dos materiais no momento das renovações, ou simplesmente às expetativas dos proprietários para usufruírem determinado rendimento, ou até ao facto de a banca ter condições mais exigentes na concessão de crédito hipotecário (embora estejamos a passar por um período de máximos na concessão de financiamentos hipotecários).

No final, tudo se resume à oferta e à procura, sendo que há mais procura do que oferta.

O tema das rendas acessíveis pode ser simples ou complexo, dependendo do facto de o Governo/Estado querer usar mais o dinheiro do contribuinte ou mais o dinheiro dos proprietários para atingir os objetivos sociais. Em período eleitoral os objetivos são mais agressivos e surgem ideias que fazem os decisores ganhar e perder votos. E este é o pior período para se tomar decisões. A relação entre cidadãos corre o risco de ficar ainda mais degradada.

2. O tema das moratórias de crédito, tanto de empresas como de particulares, tem sido bandeira do Governo e com um claro apoio público. Com o aproximar do fim do instrumento, em setembro, soaram os alarmes que, entretanto, serenaram depois da promessa de estender os procedimentos até final do ano.

Um dado curioso é que não foi o Banco de Portugal a anunciar a extensão do instrumento por mais três meses, mas antes o Governo. E a razão é simples e tem consequências. As moratórias foram o expediente encontrado na Europa para socorrer empresas e famílias, e tem o “agreement” do Banco Central Europeu (BCE) a nível de benefícios para a banca.

Em contraste, a decisão do Governo português que está a ser apreciada por particulares e empresas vai ter implicações nessas mesmas entidades. Este novo período de três meses terá de ser encarado como uma reestruturação dos créditos das empresas e criadas reservas à luz das regras de incumprimentos. E isto tem implicações, pois degrada o cadastro bancário de famílias e empresas.

Infelizmente, as nossas necessidades não são as mesmas de outros países europeus e o BCE quis, essencialmente, proteger os bancos, e estes ficarão aliviados na generalidade dos mercados europeus. Do nosso lado, tudo parece ter ficado na mesma em termos de dificuldades. Famílias e PME ganharão uns meses de descanso para se prepararem para o embate de 2022 e os bancos irão assumir novos riscos.