A Europa, tal como a conhecemos nos últimos anos, está ameaçada. São os pilares vitais que fizeram avançar a construção europeia no seio da União, mas também no que respeita à tentativa de fomento de boas relações de vizinhança. Vejamos o que está em discussão neste momento. O pilar económico e social confrontando-se com a situação da Grécia e com o perigo de deflação em toda a zona euro. O pilar financeiro com a recente revelação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação a divulgar o escândalo Swissleaks. O pilar da defesa com o conflito na Ucrânia a agudizar-se numa escalada de intensidade imprevista até agora e com o incremento do risco interno devido aos ataques terroristas.
A situação na Grécia, amplamente debatida e opinada no último par de semanas, levanta essencialmente uma questão: o insucesso das políticas de austeridade na recuperação económica dos países em dificuldades e a incapacidade de estabelecimento de planos de contingência para o falhanço de aplicação dos mesmos. Caso não se reconheça este fracasso, a tendência será a insistência em políticas que se têm revelado contraproducentes no que respeita à manutenção de um estado social e de uma convergência económica. Lembre-se que a construção que resultou na União Europeia prometia uma Europa de cidadãos e para a cidadania. É um pretexto (se é preciso algum) para refletir bem sobre a situação grega e o perigo de desagregação que alguns caminhos podem trazer.
A revelação desta semana sobre o caso do Grupo HSBC levanta outro problema: a fuga de capitais, com uma evasão fiscal associada. Este caso adensa o tom crítico sobre as relações entre políticos e sistema financeiro. Como é possível que um grupo de jornalistas tenha conseguido saber mais do que as instituições de vigilância legalmente estabelecidas? Como justificar o silêncio político em torno dos escândalos financeiros que se repetem nos estados europeus? Aos olhos do cidadão fica a questão de se tratar de um sistema financeiro que não serve os seus interesses, mas o objetivo de lucros que não revertem para a sociedade sem olhar a meios. E não se pense que é uma situação nova, os dados coligidos transportam-nos até à década de 70 do século XX.
O conflito na Ucrânia que se adensa, com o apelo dos EUA para uma intervenção de caráter militar (por exemplo, com a venda de armamento), abala os últimos anos de procura de vizinhança pacífica entre os países da União e os seus vizinhos. O pouco protagonismo assumido pela União, onde estão os estados que mais são afetados pelo conflito, é revelador de uma falta de coesão no que concerne aos temas internacionais, fazendo com que a OTAN seja mais determinante nestes casos de crise do que a própria UE. Contudo, no caso do terrorismo, igualmente ameaçador para a Europa, são os estados europeus e cada estado internamente que vai traçando as suas políticas de defesa, apesar da transnacionalidade do problema. Num e noutro caso não existem respostas efetivas.
Perante o abalo de pilares tão importantes, não é demagógico pensar-se que mais do que numa encruzilhada, a Europa está num momento de questionar a causa dos seus problemas para construir alternativas. A Europa com paz e para os cidadãos é aquela que levou os portugueses a desejar a sua entrada na CEE. É esta Europa que não devemos perder.
Cátia Miriam Costa
Investigadora do Centro de Estudos Internacionais, ISCTE – IUL