Nem sempre a inovação surge com um racional de geração de receita ou redução de custo. Em certos casos, o objetivo poderá ser o de comunicar confiança ao consumidor.

Na última semana de janeiro, a Tesla lançou um produto no mercado Chinês que poderá acelerar a aceitação dos veículos autónomos, através da maior perceção de segurança dos consumidores.A autonomia é um dos principais atributos da mobilidade do futuro, potenciada pelos recentes avanços da mobilidade elétrica. Tendo ultrapassado a fase de demonstração de conceito, encontra-se agora na importante etapa de demonstração de segurança. No entanto, os stakeholders do ecossistema automóvel e adjacentes têm já procurado antecipar oportunidades de monetização que irão surgir com a maior adoção.

Naturalmente que, não sendo necessário um papel tão ativo do condutor, o tempo passado no veículo poderá ser monetizado (por empresas de media, educação, entretimento, entre outras), por exemplo, com marketing personalizado, anúncios interativos, permitindo pagamentos e compras, entre outras.

Uma decisão recente da Tesla é um caso de estudo paradigmático desta realidade futura.

A construtora automóvel lançou um microfone que se conecta ao sistema áudio dos veículos, e permite ao condutor e passageiros participarem em sessões de karaoke a bordo. O produto foi lançado no mercado Chinês e esgotou em menos de uma hora.

Esta decisão estratégica poderá ter três leituras principais, que refletem um possível caminho a seguir pelas construtoras automóveis na promoção da adoção da tecnologia autónoma:

1. Ecossistema de lifestyle: o veículo será uma extensão da nossa casa enquanto local de trabalho e entretenimento. Os produtos complementares ao automóvel ajudam a criar um ecossistema abrangente que encapsula a experiência de utilização.

2. Fidelização: o ecossistema de produtos complementares poderá contribuir para a satisfação dos utilizadores (por exemplo, fornecendo opções de entretenimento a bordo e facilitando a execução de tarefas profissionais) e, consequentemente, para a sua fidelização.

3. Demonstração de confiança: a mensagem transmitida aos consumidores é de confiança na utilização de um veículo autónomo, ao ponto de as fontes de entretenimento consideradas distrações nos parâmetros atuais poderem ser utilizadas numa nova tipologia de veículo.

O TeslaMic tem características especificamente adequadas ao mercado em questão e às necessidades e desejos dos respetivos consumidores. Desta forma, a empresa poderá gerar insights valiosos em termos da aceitação deste tipo de produtos e do brand awareness. Adicionalmente, esta decisão reitera as intenções da marca em competir com as construtoras locais (por exemplo, a BYD ou a Xpeng) que já disponibilizam estes produtos complementares.

Por fim, assegurar a propriedade dos dados gerados pelo ecossistema do veículo (isto é, os dados gerados pelos utilizadores, peões, outros veículos, infraestruturas rodoviárias, entre outras) será um dos principais “campos de batalha” das construtoras automóveis com as empresas tecnológicas, pelo seu potencial de monetização (por exemplo, para seguradoras, empresas de entretenimento, gestoras de postos de carregamento elétrico e estacionamento, entre outras).

Este caso de estudo, paradigmático desta nova realidade, ilustra possíveis alterações significativas ao espaço competitivo do setor automóvel futuro, sendo de esperar que outras marcas realizem iniciativas semelhantes, lançando produtos inovadores que cumpram o propósito de afirmar a confiança nesta tecnologia disruptiva.