1. Olhando o próximo futuro com realismo, os desafios que enfrentamos são de monta.

Estamos a confrontar-nos com uma crise sem precedentes, os impactos muito negativos são, como em todas as recessões intensas, inevitáveis. Mas há que procurar minorá-los, evitar efeitos devastadores.

O Governo tem em preparação um Plano para a recuperação económica.

Todos temos a noção que as medidas de caráter nacional a implementar estarão sempre limitadas pelo elevado nível de endividamento público e pelo imperativo de não comprometer as gerações futuras. A gestão política tem de ser ao mesmo tempo ambiciosa e prudente, o que requer arte.

Olhando para o leque de medidas de caráter nacional já adotadas nos diversos países europeus, verificamos que são os mais desenvolvidos que mais apoios concederam, o que cava ainda mais as divergências já existentes e cria desiquilibrios competivivos ao nível dos tecidos empresariais e dos sistemas bancários dos diferentes Estados-membros.

Só com medidas de compensação efetiva por parte da União Europeia podemos atenuar o acréscimo de divergência face aos países que não enfrentam as mesmas restrições. Esperemos que o pacote de iniciativas que está em cima da mesa, e que têm essa componente, avance depressa.

A retoma económica exige, pois, que sejamos muito eficazes e clarividentes na seleção das medidas a contemplar.

Sabe-se que os alicerces do crescimento económico são quatro:

– Iniciativa e capacidade empresarial, o que implica capital, acesso a financiamento, capacidade de gestão e recursos humanos capacitados;

– Competitividade, alicerçada na produtividade, na inovação e na eficiência;

– Um quadro institucional favorável, compatível com o funcionamento da economia de mercado (sob pena de penalização nas opções de investimento), compreendendo reformas estruturais que melhorem a competitividade, políticas que melhorem o nível de capital humano, mercados laborais flexíveis e um sistema financeiro sólido;

– Um quadro macro-económico sustentável e credível.

É da análise de cada um destes fatores que deverão extrair-se as medidas de apoio ao crescimento económico.

O robustecimento da situação económica e financeira das empresas (designadamente por via de recapitalização e melhoria dos balanços, envolvendo, se necessário, operações de restruturação), o investimento e o acesso a financiamento constituirão o primeiro grupo onde são fundamentais medidas de política.

O investimento deve visar fontes diversificadas de criação de riqueza, com especial enfoque naquelas onde se podem valorizar fatores competitivos e em projetos estruturantes e/ou inovadores.

É um facto que as características desta crise levam a considerar como prioritário o esforço acrescido para permitir sustentar inúmeras PME viáveis, fortemente atingidas pela recessão e cujo futuro há que preservar. Mas este momento convida também a visões estratégicas.

Empresas de dimensão relevante podem ter caráter estruturante e são demasiado importantes para qualquer economia desenvolvida. Têm mais capacidade para melhorias de competitividade, alimentam redes de PME, criam e beneficiam da marca. As “fast growing companies” assumem igualmente especial relevância, geram cada vez mais valor. A fusão de PME também permite sinergias, ganhos de escala e de eficiência. Facilitar um crescimento económico sustentado passa muito por promover e atrair investimento para estes objetivos.

Mas, para atrair investimento é fundamental a perceção dos mercados. Estamos inseridos na União Europeia, o que é em si mesmo uma excelente rede, e a reorientação estratégica, para indústrias de base localizadas na Europa, que a pandemia veio impulsionar, constitui uma tremenda oportunidade, mas tais fatores não serão suficientes se, em comparação com outros destinos, os investidores temerem ou considerarem que existe um contexto que nos cria desvantagens competitivas ou nos afasta dos princípios da economia liberal.

A coerência e a consistência das decisões, em relação aos grandes objetivos – crescimento económico substancial e inclusivo e criação de emprego – são determinantes para ultrapassar as dificuldades.

2. Fez esta semana 29 anos que, em Palmela, se realizou a cerimónia de assinatura do contrato de investimento entre o Estado Português e a NEWCO (Ford/Volkswagen), depois Autoeuropa, o maior projeto de Investimento Direto Estrangeiro, industrial, de sempre no nosso país, no montante, então, de 3,2 biliões de dólares.

Tive a honra de presidir a essa cerimónia, na qualidade de Ministro do Comércio e Turismo, com a responsabilidade da contratação de IDE e, como tal, da condução do processo negocial, desde a estratégia às negociações e à coordenação da participação ativa e solidárias dos diferentes Ministros com intervenção no projeto: Indústria e Energia, Planeamento e Administração do Território, Finanças, Emprego e Segurança Social e, ainda, das Obras Públicas e do Ambiente, dada a natureza multidisciplinar das matérias em jogo.

Da minha intervenção nesse evento, saliento as seguintes passagens:

“- Este investimento, superior a 450 milhões de contos (US$ 3,2 billions) é de fundamental relevância nacional. É verdadeiramente um projeto nacional, que obteve um amplo consenso genérico das forças políticas e sociais, com enorme impacto tanto em termos macroeconómicos, como de política industrial e de ordem regional e ambiental.

– Trata-se de um investimento estruturante, na medida em que se enquadra na linha estratégica que visa o aumento da competitividade desta indústria (europeia) face à crescente implantação japonesa nos mercados mundiais (razão para obter acesso a fundos estruturais e de coesão).

– O projeto Ford/Wolkswagen vai contribuir, em larga escala, para um novo impulso ao processo de modernização e diversificação da nossa indústria, que está em curso (conduzido pelo ministro Mira Amaral).

– O projeto desencadeará um conjunto de novos investimentos (industriais e em infraestruturas) (…) e irá criar, por efeito de arrastamento, uma rede interligada de PME, produzindo bens de elevado conteúdo tecnológico, um mercado interno seguro para a indústria de componentes, abrindo muitas oportunidades de bons investimentos, designadamente em joint-ventures”.

É generalizadamente reconhecida a importância da Autoeuropa para a economia nacional e para a região de Setúbal. Mas é particularmente relevante constatar que a Autoeuropa é uma das mais competitivas fábricas do Grupo Volkswagen, indicador claro de que o nosso país tem condições para captar, com benefício para o investidor e para o país, investimentos de grande dimensão, geradores de boa rentabilidade e alimentadores de um número significativo de PME.