Já aqui se falou da 4ª revolução industrial a propósito da auto-execução ecossistémica. Quem se lembra do aparecimento da Web nos anos 90? Quantas pessoas ou empresas anunciaram na altura a abertura de “uma página na internet” para aproveitar as novas potencialidades de comunicação? Teria sido possível imaginar, na altura, que a Web iria promover o desastre das dotcom, o advento das Big Techs e a destruição dos modelos de negócio tradicionais expostos à nova hiper-concorrência?

Todos os eventos com importância significativa têm um ciclo de vida, e são, portanto, emergentes antes de atingirem a maturidade, pelo que não há verdadeiramente surpresas. Até os tsunamis são precedidos de um recuo extraordinário do nível da maré logo antes do seu avassalador avanço. Basta, portanto, saber ler os sinais.

Porém, como distingui-los no meio de todo o ruído à nossa volta? Quantos são os conceitos novos que custa aprender? Quantos são os efeitos de manada, rebanho ou alcateia absolutamente enganadores? Quantas são as utopias em coabitação com os profetas da desgraça? Quanta desinformação se considera ser a verdade absoluta? Falemos então de blockchain.

Já lá vai o tempo em que se tinha de explicar que blockchain não é a bitcoin e que esta última não é um esquema de Ponzi. Ao menos isso. Agora tem-se falado mais de temas úteis como os NFT, i.e., Tokens Não Fungíveis. Aliás, o conceito de NFT não é novidade e foi vislumbrado em 2014, quando o Ethereum democratizou a tecnologia dos Smart Contracts. O primeiro standard de NFT (ERC721) também já tem praticamente três anos. Até o próprio conceito de Token anda a ser discutido ainda há mais tempo.

Os NFT são Utility Tokens, mas um dia também conquistarão o espaço dos Security Tokens, com um impacto ordens de grandeza maior ao que estamos hoje a assistir. Então quais são os princípios por detrás destes exemplos de inovação emergente, permitida pela BlockChain, e que está já em ebulição na #DeFi, imaginando que outros sectores se seguirão à velocidade da luz?

Alguém me disse, há muitos anos, que o que importa não é a tecnologia, mas o uso que fazemos dela. Ora, a blockchain é essencialmente nova e diferente, e são as suas potencialidades estratégicas que vão assegurar o aumento contínuo da inovação emergente, a tal que não vai parar de nos surpreender, sempre rumo à 4ª revolução industrial. Por definição, é o facto de a inovação ser emergente que a torna imprevisível, porém, a mão de Adam Smith não vai deixar de continuar a fazer das suas, pelo que há que saber ler as suas primeiras ténues manifestações. A história ajuda a separar o trigo do joio, senão vejamos.

As tecnologias de informação começaram por automatizar o tratamento de actividades específicas das empresas, com enormes vantagens de eficiência (e o equivalente em reconversão de funções). Exemplos como a gestão de stocks ou os cálculos contabilístico-financeiros estão bem presentes na memória. Logo a seguir, essa automatização passou pela integração de actividades em processos, num movimento conhecido por reengenharia. Este movimento acabou por se estender às transacções entre empresas, sobretudo com o crescimento da Web.

E foi este o mundo criado pelas tecnologias, com a auto-execução como forma de automatização de transacções, tanto externas como internas, cada vez mais complexas e rápidas (nota: antes da blockchain a auto-execução não era ecossistémica). Aliás, a Inteligência Artificial acabou por ser expoente dessa complexidade, e a mobilidade dos dados o catalisador da referida rapidez. Então como vai ser agora com a blockchain?

A blockchain eleva a automatização e a auto-execução ao nível do ecossistema, englobando todas as interligações subjacentes. É de tal forma potente que deu inclusivamente origem ao conceito de DAO (Organizações Autónomas Distribuídas), o que não deixa de ser tão novo quanto estranho. Aliás, desengane-se quem acredita que já não são necessárias empresas ou outras organizações para tomar conta das transacções económicas. Precisamos delas, sim, mas organizadas de outra forma.

DAO apenas significa que uma parte das transacções que antes carecia da custódia de organizações enquanto pessoas jurídicas para o seu processamento, podem agora ser simplesmente automatizadas com a auto-execução ecossistémica. Ou seja, tal apenas demonstra o poder revolucionário da blockchain, obrigando-nos a olhar para o redesenho das cadeias de valor antes de tudo o mais. É uma evolução que tem de incluir todas as facetas relevantes da sociedade, a começar pela regulação, as leis e o direito. O cenário é desenhado com base nas propriedades da tecnologia, como temos feito sempre, neste caso com base nos princípios estratégicos subjacentes à auto-execução ecossistémica.

De uma forma ou de outra, é para lá que caminha o mundo, essencialmente em desfavor dos profetas da desgraça e também das utopias sempre presentes. Prova-se assim que a 4ª revolução industrial é inelutável, e é por isso que a blockchain se tornou definitivamente incontornável.