A inflação é o mais perverso dos “impostos” e incide sobretudo sobre os mais pobres, amputando o seu parco rendimento disponível. A classe média e as empresas são igualmente afectadas, mas sendo normalmente devedores à banca, podem ser ajudadas, pois a dívida é estável (até aos juros aumentarem, como é expectável) e o rendimento dos devedores aumenta nominalmente.
O Governo enterra a cabeça na areia, classificando artificialmente a inflação de conjuntural e temendo que, com o justo aumento da função pública, a inflação se torne estrutural e gere uma espiral inflacionista, atendendo ao peso excessivo da massa salarial do sector público na economia.
Percebe-se esse receio e o paradoxo em que vive este Governo, quiçá o executivo que ultrapassará o de Passos Coelho na aplicação de medidas de austeridade, induzidas pelo efeito inflacionista.
São os reformados, os pensionistas, e, em geral, os que ganham o ordenado mínimo, os que mais sofrerão com a inflação, e toda a função pública, todos eleitores do PS, que agora veem que a realidade económica os defrauda.
Foram anos de erradas políticas de esquerda, sem estímulos à economia, sem apoios ao sector privado (vide o PRR, todo virado para o sector público), sem preocupações de apostar na criação de riqueza para depois a poder distribuir, de inexorável crescimento da despesa pública corrente, em salários, pensões e subsídios.
Agora é tarde. Mas mais vale tarde do que nunca. E o aumento da função pública em 0,9% quando a inflação se aproxima dos 10% – em Espanha já atingiu esse limiar e pergunta-se como é possível não estarmos também nesse limiar, atendendo à dependência da nossa economia face à espanhola? –, levará, pelo menos, à perda do rendimento disponível igual a um salário por ano em cada trabalhador da função pública.
Atendendo ao nível da dívida pública vs produto interno bruto (e a inflação, em certa medida, diminuirá essa relação), o Estado teria de aumentar as suas receitas fiscais para financiar o gap salarial causado pela inflação. Mas não nos esqueçamos que os impostos indirectos aumentarão por causa da inflação, os directos pelo aumento do PIB e que a dívida irá manter-se.
As medidas a tomar para o futuro serão as mesmas de sempre: apostar no sector privado, incrementando a criação de riqueza, tributável, reformando o sector público, premiando os melhores e não ter medo de emagrecer o peso do Estado, libertando tarefas que o Estado pode, e deve, subcontratar, nos sectores da saúde e na educação.
Reduzir a massa salarial da função pública, reduzir impostos sobre as empresas, reduzir os impostos sobre as famílias mais carenciadas, estimulando o empreendedorismo, propiciando a criação de riqueza, são os únicos caminhos que podem e devem ser trilhados.
O PS não gosta destes caminhos, pois sabe que os seus eleitores tradicionais, funcionários públicos, pensionistas e reformados, não gostam de reformas. Mas a inflação tem vários efeitos perversos e esse é o único efeito positivo: mudar a mentalidade destes no sentido de perceberem que é preciso mudar de política, é preciso reformar.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.