Nem uma pandemia mundial e 1.500 mortos travam o populismo no nosso país. Depois das polémicas comemorações do 25 de Abril, 1º de Maio e da manifestação contra o racismo que colocou milhares nas ruas em várias cidades, eis que assistimos à batalha da ‘minha manifestação é maior que a tua’.

Numa altura em que Portugal volta a assistir à subida diária do número de infetados, o Chega convocou uma manifestação para o próximo dia 27 de maio. O motivo? Contrapor à manifestação contra o racismo uma outra que pretende mostrar que os portugueses não são racistas.

Descontando toda e qualquer falta de lógica por esta manifestação ser convocada pelo único partido que, através do seu deputado na Assembleia da República (AR), defendeu um ato de racismo contra uma etnia, colocar muitos em risco numa altura em que a grande Lisboa é alvo de medidas excecionais de combate à pandemia trata-se de um ato inconsciente depois de tantas críticas terem sido feitas ao primeiro evento.

Se dúvidas houvesse que estes atos apenas servem para dividir os portugueses e acender velhos ódios, não se fez tardar a convocação da extrema-esquerda para uma manifestação para o dia anterior na AR contra a xenofobia e a entrada do partido de extrema-direita no parlamento. Assim se prova que os extremos se atraem e pouco os distingue e que é mais fácil apontar o dedo e criar soundbites que trabalhar e apresentar soluções.

Enquanto as extremas esgrimem palitos nestes duelos inglórios, o país afunda e o Governo ficou prisioneiro no próprio labirinto que criou.

No início do mês, Portugal foi o primeiro país a receber o selo “Safe Travel”, atribuído pelo World Travel & Tourism Council, que certifica destinos que cumprem regras de segurança e visa dar confiança a quem viaja após as restrições para evitar a propagação da Covid-19. Mas em poucas semanas a situação reverteu e Portugal está na linha vermelha de países a evitar num péssimo processo de desconfinamento.

É curioso imputar os novos focos de infeção a comportamentos irresponsáveis dos mais jovens, a festas ilegais, idas à praia e ao Santuário de Fátima, e oficialmente nenhum caso de infeção decorrer das manifestações anti-racismo, da celebração do 1º de Maio, ou do espectáculo que encheu o Campo Pequeno onde marcaram presença figuras de Estado.

As medidas apresentadas para a contenção da epidemia na Grande Lisboa são insuficientes, tardias e muitas até inconsequentes. Faz sentido autorizar manifestações e, em simultâneo, proibir ajuntamentos de mais de dez pessoas? Faz sentido que milhares de passageiros provenientes de países de alto risco entrem no país sem qualquer controlo sanitário? Ou que se tenha permitido a livre circulação nos feriados de junho quando já existiam inúmeros casos identificados?

Vamos todos pagar caro a irresponsabilidade de uns poucos.