1. Temos assistido a uma versão à moda da política portuguesa do filme “A Morte de Estaline”, a brilhante sátira política, plena de humor negro, do realizador Armando Iannucci. No filme, Josef Estaline morre e os homens que lhe querem suceder – nos intervalos da preparação do enterro do histórico líder soviético – lutam por espaço, por influência, por ascendente. Em suma, lutam pelo poder.

Por cá temos tudo isto, mas ao contrário. É António Costa – que, já se viu, não pretende sair tranquilamente – quem está a enterrar todos os seus potenciais sucessores. E, quer o tivesse desejado e planeado ou não, a tragédia alada em três atos que é a TAP deu-lhe o móbil, a arma do crime e, pelo menos até ao momento, o álibi perfeito.

Pedro Nuno Santos, o prego que mais pôs a cabeça de fora na futura corrida contra o líder socialista, está a ser desfeito aos bocados desde há meses. Está agora claro que o então ministro das infraestruturas e a sua equipa geriam a companhia aérea como se fosse uma coutada sua e do PS, que em muitos casos fizeram opções que demonstram enorme desconhecimento sobre aviação e, mais importante, que a promessa deixada aos portugueses de que a TAP não era para privatizar, afinal era letra morta. Não foi essa a premissa para pedir aos portugueses a injeção de 3,2 mil milhões na TAP? Afinal estivemos a sanear a companhia para agora a passar, limpa, aos privados? Outra vez?

Fernando Medina, o candidato que corria na pista de fora, também não fica melhor na fotografia. Já conhecido à boca pequena como o “Ministro Opção D” – ou seja, “Não sabe/Não responde” – o ministro das Finanças está a lutar pela sobrevivência. A juntar aos muitos episódios enquanto presidente da Câmara de Lisboa em que nada soube – lembram-se dos dados passados aos russos?  E dos contratos de construção “à medida” para uma empresa ligada ao PS? – Medina soma agora novos desconhecimentos. Nada sobre a indemnização de Alexandra Reis, nem quando a convidou para secretária de Estado do Tesouro, nada sobre o contrato da CEO Christine Ourmières-Widener, nada sobre a ausência de contratos de gestão na TAP.

Quantas vezes se pode alegar desconhecimento antes de as pessoas começarem a questionar o que raio anda a fazer um ministro a quem tantas coisas importantes passam ao lado?

A comissão parlamentar de inquérito sobre a gestão da TAP tem confirmado algumas destas perplexidade, tem revelado outras e tem mudado a opinião de muitos portugueses, que nestas últimas semanas têm acompanhado o caso de forma fervorosa, como se de uma série de Netflix se tratasse. E ainda bem. Há esperança para o interesse na política nacional.

2. Continua a saga do “novo aeroporto” de Santarém. Por ordem: a câmara local dá exclusividade à ideia (?) de uma estrutura a instalar em terrenos que não sabemos quais são (??), ou de quem são, com dinheiro de investidores que desconhecemos (???) e com uma chico-espertice de construir 25 quilómetros além da área (um raio de 75km a partir de Lisboa) em que o Estado português está contratualmente ligado à Vinci, a dona da ANA (????). Se o Governo alinhar nisto, alguém me explica em que é que isto não é poaching? E como é que a Vinci não ganha isto facilmente em tribunal?