A operação anunciada este fim de semana, mediante a qual a UBS adquiriu o Credit Suisse, suscita várias questões, como sejam (i) como se explica que credores “juniores” (titulares de instrumentos AT1) recebem um tratamento mais gravoso do que os accionistas e que consequências terá, no futuro, essa opção das autoridades suíças sobre as emissões de AT1? ou (ii) como se justifica que uma operação que é, formalmente, um acordo entre duas entidades privadas, tenha dispensado uma votação pelos seus accionistas ou, ainda (iii) como articular as alterações à lei “de última hora”, de 19 de Março e que entraram em vigor às 20h00 desse mesmo dia, com os princípios do Estado de Direito.

Porém, a questão que quero aqui abordar, é uma outra. Por um lado, e na sequência da crise de 2008, passou a existir em várias jurisdições europeias um novo quadro/instrumento jurídico – a resolução – com o qual se visou alcançar a “quadratura do círculo”, ou seja, lidar com bancos em situação próxima da insolvência, assegurando: a) aquela que é a solução num processo “normal” de insolvência: os accionistas e credores suportarem as perdas; e, simultaneamente, b) evitar efeitos sistémicos negativos e assegurar a continuidade das “funções críticas” do banco afectado.

Por outro lado, a operação concluída este fim de semana sobre o Credit Suisse não correspondeu, porém, a uma resolução: foi formalmente uma operação de mercado. Mas, ao mesmo tempo, e tal como noticiou o Financial Times, parece ter sido uma operação imposta pelas autoridades, que terão “forçado” a UBS a adquirir o Credit Suisse, facultando, mesmo, uma garantia pública (loss protection) até nove mil milhões de francos suíços para problemas que a UBS venha a encontrar no Credit Suisse.

Isto significa que, tendo sido uma operação “incentivada” e patrocinada pelas autoridades, estas não quiseram ou concluíram que não podiam utilizar o instrumento da resolução bancária.

Por que razão tal sucedeu?

É, ainda, cedo para se ter uma resposta clara, mas admito que a explicação esteja no facto de o Credit Suisse ser um banco de grande dimensão seja a nível global, seja no mercado suíço. Isso faz com que, por muitos planos de resolução que existam, a sua resolução num fim de semana fosse provavelmente difícil. E, por outro lado, uma resolução poderia ser mal vista pelos mercados financeiros, afectando a sua estabilidade, e poderia projectar-se negativamente sobre a imagem da Suíça no mundo financeiro. Estivesse em causa um banco de menor dimensão e, admito, a solução teria sido outra.

É bom recordar que a “resolução” tinha e tem em vista, entre outros objectivos, evitar o dilema do “too big to fail”: instituições que, pela sua dimensão e pela ausência de um quadro adequado para lidar com a sua pré-insolvência, forçam o Estado a intervir para as salvar (bail out). Ora, o sucedido este fim de semana e a utilização de um caminho diverso do da resolução, incentivado e “patrocinado” pelas autoridades, parece mostrar que o “too big to fail” afinal não desapareceu, que há bancos perante cuja dimensão se torna muito arriscado seguir a via da resolução. E, se é assim, cabe perguntar:

Faz sentido admitir ou mesmo incentivar que os bancos continuem a ser cada vez maiores, quando, aparentemente, quanto maiores são (seja a nível global, seja no mercado onde actuam), menos “resolúveis” se revelam e, um dia que tenham problemas, mais necessitados estão de uma solução com apoio público?

Quais as dimensões óptima e limite para um banco, considerando o risco que, por natureza, a sua actividade envolve?

Não há respostas nem soluções fáceis, mas o que sucedeu este fim de semana justifica uma reflexão para evitar que se descanse em cima de soluções que, na prática, não passam o teste da realidade. É que, provavelmente, há mesmo (e de forma crescente) bancos “too big to fail”.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.