… Assinalo uma correcção que, ainda assim, traz consigo uma preocupação

Segundo estimativas da Comissão Europeia, Portugal poderá vir a ser ultrapassado pela Roménia já em 2024 no ranking de desenvolvimento económico, na medida em que o indicador do PIB per capita atingirá nessa data os valores de 79% e 78% da média europeia, para a Roménia e Portugal respectivamente. A notícia acompanhada do tratamento editorial específico foi revelada na edição do jornal “Expresso” de 24 Novembro p.p. e caiu que nem uma bomba!

Pois não é um facto que Portugal no início do século era três vezes mais desenvolvido que a Roménia? Pois não é um facto que Portugal aderiu à União Europeia uns vinte anos antes da Roménia, tendo, entretanto, beneficiado dos vultuosos quadros comunitários de apoio?

Contudo, tudo isto não quer dizer que a economia portuguesa pós-adesão não tenha registado melhorias significativas nas suas bases estruturais e na sua dinâmica! Portugal de hoje está em muito melhor situação. Mas tal não obsta a exprimirmos grande preocupação face a esta situação de “ultrapassagem” por parte da Roménia, situação esta já verificada nos últimos anos por parte de economias de alguns “antigos países de Leste” connosco mais identificados em termos de “patamar concorrencial”

Esta realidade é demasiado dura para que o Governo em vez de andar a proclamar que Portugal tem nos últimos anos registado crescimentos económicos superiores à média europeia (o que é verdade), se preocupe em informar-nos com fiabilidade sobre o porquê destas recentes ultrapassagens.

No entanto – e agora para o caso particular da comparação com a Roménia – há que, em nome da seriedade intelectual, introduzir algumas correcções que em bom rigor deveriam também ter sido  aprofundadas por parte da oposição política e por certa comunicação social. Concretizando:

O indicador usado para o ranking do desenvolvimento económico é –  como atrás se referiu – a relação entre o PIB e o número de habitantes, o que quer desde logo dizer que, em abstrato, para um mesmo nível de PIB durante um determinado horizonte temporal chegaria uma queda da população residente para uma melhoria  do indicador de desenvolvimento económico e, logo, do posicionamento no ranking respectivo.

Ora, é um facto que nos últimos 20 anos a população da Roménia terá decrescido cerca de 20%, naturalmente fruto  da procura de oportunidades fora do seu país por parte dos romenos, o que parece indiciar que a situação económica e social romena apresenta sensíveis fragilidades. Daí a necessidade de introduzir esta correcção interpretativa no indicador em análise, o que mitiga o carácter bombástico da situação divulgada.

Mas não podemos deixar de constatar que o numerador de tal indicador (ou seja o PIB)  tem registado para a economia romena,  nos últimos tempos, níveis superiores aos da economia portuguesa, certamente fruto do aproveitamento dos fundos comunitários atribuídos, os quais, de uma forma lógica, são inicialmente afectos ao lançamento e reestruturação de significativas infraestruturas  de que o país carecia (tal como em Portugal na sua pós-adesão à União Europeia) e que constituem bases para crescimentos económicos mais sustentados.

Com efeito, verifica-se nos últimos tempos na Roménia, em termos relativos, um crescimento do investimento e em particular do investimento público, e bem sabemos o efeito potenciador que de tal advém em termos de relançamento económico. Contudo, informações recolhidas junto de quem melhor conhece a realidade romena apontam para a existência de ainda significativas fragilidades de alguma forma retratadas nos níveis de pobreza e nas insuficiências dos sistemas educativo e da saúde. Cabe mesmo questionar se as classes médias portuguesas trocariam Portugal pela Roménia, e a sensibilidade recolhida vai no sentido negativo.

Uma nota final deve ser valorizada, porque estruturante. E ela tem a ver com o nível da dívida pública em relação ao PIB: 47,3% na Roménia versus 110% em Portugal. É que de tal resulta que a margem de manobra – por exemplo no âmbito do investimento público – está bastante mais condicionada em Portugal, e digo-o mesmo considerando que a política de “contas certas” constitui, de momento, uma via correcta para a consolidação da economia portuguesa enquanto inserida num mercado global. Em suma, a preocupação com a situação da economia portuguesa não pode ser camuflada e aguardemos que uma boa implementação do famoso PRR traga melhores notícias.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.