Porventura, numa tentativa de me preparar para o mundo, fui educado com recurso a um plano maléfico: ao contrário das pessoas que têm uma solução para cada problema, a minha mãe apresentava consistentemente um problema para cada solução.

Talvez em virtude desta condição, que pouco interessa ao leitor, tenha crescido com um conforto razoável face àquilo que considero ser uma verdade: o mundo, e a vida de quem nele habita, é caracterizada por uma omnipresença de problemas das mais variadas naturezas.

A palavra problema tem uma conotação negativa, o que me inquieta, porque a história demonstra que foi a resolvê-los que se fez a evolução da humanidade.

Os problemas têm má fama e não a deviam ter, até porque, em tese, resolvê-los está num lugar intelectual onde o humano ainda consegue competir com a máquina.
Vejamos: a era digital, que é caracterizada pela democratização do acesso e a utilização exponencial de tecnologia, aparenta pôr em causa os fundamentos de algumas tarefas e atividades às quais damos o nome “trabalho”.

Defendo que, se não nos deixarmos levar pelo facilitismo das soluções binárias, a tecnologia pode contribuir para processos intelectualmente mais robustos de resolução de problemas e tirar-nos o volume de trabalho que nos impede de refletir.
Aquilo que nos consome mais tempo em processos de resolução de problemas é, tipicamente, a atividade mais passível de ser realizada com recurso a máquinas: o processamento de informação e dados.

Pelo contrário, atividades como a comunicação, coordenação e interação com outros, bem como a argumentação e tomada de decisão, parecem ser menos permeáveis à robotização.

Esta conclusão fica mais evidente quando, no topo das competências mais relevantes para os empregadores até 2025, o pensamento analítico, a inovação, a aprendizagem ativa, a resolução de problemas complexos, o pensamento crítico e a criatividade se destacam.

Há uma esperança, ainda que curta, que a digitalização e a robotização nos tragam as ferramentas para cooperarmos num espaço de construção argumentativa que nos ajude a consolidar opiniões próprias, quer na resolução dos nossos desafios empresariais, quer nos nossos desafios enquanto sociedade.

Num mundo cada vez mais complexo, onde a agenda mediática é dominada por discussões binárias, muitas das quais, com a dimensão intelectual de uma caixa de sapatos, a arte de estruturar e resolver problemas é um dos caminhos para apresentarmos ideias e soluções simples, por contraponto ao estado vigente de simplismo crónico.