A queda do iene japonês

Se as expetativas de inflação mundiais continuarem a aumentar, existe uma grande probabilidade de o banco central do Japão abandonar a sua postura atual e deixar que as yields subam, valorizando o iene. 

Enquanto nos Estados Unidos a Reserva Federal (Fed) já começou a aumentar as taxas de juro, para controlar a inflação, no Japão as políticas monetárias continuam assentes nas medidas de quantitative easing – o Bank of Japan afirmou que iria continuar a comprar Obrigações do Tesouro a dez anos para tentar controlar a yield curve. Se olharmos para a diferença entre as yields de cada Obrigação do Tesouro a dez anos dos dois países (cerca de 2,5%), vemos que como há possibilidade de ter mais retorno a comprar obrigações americanas, a atratividade das obrigações japonesas diminuiu drasticamente, o que faz depreciar o iene.

Recentemente, a 28 de abril, os receuios de muitos economistas e investidores tornaram-se reais e o iene japonês caiu abaixo da marca dos 130, em relação ao dólar. Depois de ter começado o ano na marca dos 115, o iene foi desvalorizando gradualmente, mesmo com a inflação nos EUA a subir, atingindo o valor mais baixo nos últimos 20 anos. Muitos “policymakers” sempre viram um iene mais fraco como sendo uma solução para a falta de atratividade das suas exportações e, embora isto tenha funcionado durante alguns anos, os mais recentes acontecimentos geopolíticos e a pandemia vieram tornar esta situação mais complicada.

A guerra na Ucrânia está a tornar o petróleo, comida e outras matérias-primas mais caras, o que traz grandes problemas a um Japão altamente dependente destas importações. Exemplificando, grandes empresas japonesas como a Canon, Toyota e Sony registaram grandes lucros no primeiro período do ano, visto ser mais barato exportar o que é produzido no Japão para o estrangeiro. No entanto, esta descida do iene (-11,69% de março a maio) está, como referido acima, a coincidir com a subida do preço das matérias-primas, o que poderá ter fortes impactos – no caso da Toyota, estima-se queque possa levar a uma queda de 11 mil milhões de dólares no seu resultado operacional (até 2024), o que ultrapassa largamente o ganho cambial que teriam (cerca de $1,5 mil milhões).

Normalmente, parte dos danos resultantes de um iene desvalorizado seriam mitigados pelo aumento do número de turistas, dado o seu poder de compra acrescido. No entanto, a pandemia, para além de ter provocado disrupções nas linhas de distribuição devido à elevada procura que não consegue ser satisfeita por uma indústria ainda em recuperação, fez também com que o Japão fechasse as fronteiras a estes mesmos turistas. Como consequência, investidores e empresas já começaram a procurar o estrangeiro como forma de mitigar esta depreciação do iene o que, por sua vez, fez com que a balança comercial japonesa registrasse valores negativos pelo nono mês consecutivo.

Resta saber até onde é que o iene irá descer. Até agora, foi uma das principais moedas a registar pior performance este ano. O risco de recessão pelo mundo inteiro e o facto de o iene estar altamente desvalorizado apontam para que a moeda encontre apoio de investidores que queiram conservar o seu dinheiro. Assim, se as expetativas de inflação mundiais continuarem a aumentar, existe uma grande probabilidade de o banco central do Japão abandonar a sua postura atual e deixar que as yields subam, valorizando o iene.

O artigo exposto resulta da parceria entre o Jornal Económico e o ITIC, o grupo de estudantes que integra o Departamento de Research do Iscte Trading & Investment Club.

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