Cerca de duas semanas depois de a Rússia invadir território da Ucrânia em várias frentes, a crueza dos números diz-nos que morreram milhares de pessoas, militares e civis, e que há dois milhões de deslocados, com tendência para duplicar.

Ao fim destas duas semanas de confrontos, e com negociações pelo meio com o objetivo de abrir corredores humanitários, vislumbram-se as primeiras luzes ao fundo do túnel.

É claro o papel da Turquia, e muito em particular do primeiro-ministro de Israel, Naftali Bennett, na assunção de protagonismo para manter aberta a via do diálogo. Muito se falou de corredores aéreos humanitários que Israel teria já conseguido (a par de um possível hospital de campanha), mas aquilo que é mais relevante é a aparente cedência de ambos os protagonistas, Putin e Zelensky.

O primeiro, agressor, já insinua que quer o controlo dos territórios de Donbass e da Crimeia, enquanto a versão inicial da guerra seria ocupar a totalidade do território e a criação de um governo pró-russo na Ucrânia. O segundo está a aberto a deixar cair o pedido de adesão à NATO e à eventual criação de um estatuto especial para as regiões do Donbass.

Mas o que está verdadeiramente em causa é a criação de retaguardas para ambos os protagonistas, sendo que a situação do presidente russo está claramente fragilizada. Para quem esperava ter uma vitória em muito pouco tempo, estas duas semanas de combates e perdas tremendas em efetivos e material, e sobretudo na imagem desastrosa perante o Ocidente, deixou-o isolado.

Para Zelensky, a questão é saber até quando poderá aguentar, na medida em que a NATO e os países ocidentais não fazem o que pede. Possivelmente já terá um plano organizado de resistência se Kiev cair em mãos russas. Mas o mais premente é perceber como se pode organizar uma retirada mais política do que militar para ambos os lados.

Putin tem uma situação bem mais problemática. O envolvimento da sociedade russa na invasão de um território que não é seu precisa de ser bem justificada. Internamente, a oposição está silenciada, mas ela existe e tem força. Putin tem tudo a perder se na guerra de comunicação não garantir a vitória moral e territorial.

O seu plano de recuo significaria o desagregar da Rússia e isso seria mais perigoso do que o statu quo. É por isso que na Europa ocidental ninguém quer uma futura Rússia sem uma governação forte. E o escape manter-se-á enquanto continuarem as transações de petróleo e gás do país para o ocidente, e Moscovo continuar a receber algumas centenas de milhões de euros diariamente.

Zelensky até pode vir a perder no terreno, mas moralmente é um vitorioso e um herói. Para os ocidentais, Zelensky é o único pilar que permitirá manter a ordem mundial estabelecida.

Putin iniciou uma guerra e abriu a caixa de pandora para que o atual amigo, a China com tendências expansionistas, possa vir a ser o arqui-inimigo da Rússia no cenário que se segue. Mais uma vez, são a Turquia e Israel os fiéis da balança que podem levar ambos os lados a entender-se.

As sanções económicas estão a ter resultados e os economistas da seguradora Coface estimam uma queda do PIB russo, em 2022, que se traduzirá numa recessão de -7,5% e numa avaliação de risco-país de nível D, equivalente a risco muito elevado. Na Europa ocidental, o fim das compras de petróleo e gás colocará a zona euro em crescimento zero, a par de uma subida rápida da inflação. Ficaremos em situação de estagflação, i.e. estagnação no crescimento e inflação em alta.