O uso do digital como um novo canal de marketing, seja para comunicar, vender ou mesmo distribuir, tem permitido às empresas terem acesso a uma multiplicidade de oportunidades únicas para interagirem com os seus clientes (atuais e prospetivos).

Um desses canais faz uso de chatbots, que se tornaram uma realidade cada vez mais presente nas redes sociais e nas aplicações para troca de mensagens. Os chatbots são programas que simulam conversas humanas por meio de chats, servindo como assistentes virtuais, executando tarefas simples – como providenciar alternativas de pacotes para a acesso à internet – ou mais complexas –como fazer compras ou prestar assessoria financeira.

O uso de tecnologias alavancadas pela inteligência artificial (IA), como é o caso dos chatbots, está, todavia, a ser alvo de crescente escrutínio público e até de algum ceticismo. De facto, é esperado que nos próximos dez anos, a infusão de IA na maioria destas tecnologias permita complementar e substituir parcialmente os seres humanos em situações de compra e serviços de atendimento. Estas expectativas são suportadas pela rápida expansão do mercado de chatbots, que se espera que atinja 1,34 mil milhões de dólares já em 2024. Porém, não são só vantagens e um dos principais obstáculos é chamado uncanny valley, como veremos a seguir.

Um problema decorrente do uso de chatbots é que, num futuro próximo, estes programas podem vir a ser confundidos com humanos, nomeadamente se sua natureza (robótica) não for divulgada. Ora isto pode levantar questões éticas envolvendo os clientes. Nesse sentido, tem sido defendida a ideia de que as pessoas devem estar cientes da natureza dos chatbots e devem ser alertadas para as implicações de interagirem com um robot e não com outra pessoa.

Para além disso, também é verdade que apesar dos benefícios potenciais oferecidos pelo uso dos chatbots, as empresas também se debatem com um desafio importante: a resistência dos clientes em sentirem à vontade no trato com um programa. De facto, muitas pessoas ainda se sentem desconfortáveis ​​ao interagir com programas de computador para revelar necessidades pessoais ou decisões de compra, e parecem estar inclinadas a preferir humanos em vez de formas de IA, o que não deixa de constituir um obstáculo adicional ao uso de chatbots.

Ou seja, para além do problema ético que leva a que as empresas tenham de divulgar que o agente conversacional com quem o seu cliente está a falar é um robots e não uma pessoa, estas também enfrentam o problema da resistência à interação, pois falar com um programa não se afigura tão prazeroso como falar com outro ser humano.

É neste seguimento que surge o fenómeno do uncanny valley: um termo usado para descrever o relacionamento entre a máquina – que emula comportamentos humanos – e o ser humano – que se sente desconfortável por se sentir a interagir com uma máquina e não com um outro ser humano. Este fenómeno põe em evidência uma resposta emocional por parte do indivíduo que sente constrangimento ou até repúdio, sabendo que do outro lado tem um programa computacional altamente desenvolvido e preparado para emular o comportamento humano.

Em última análise: quanto mais sofisticado um chatbot é, mais pode criar-se uma contradição de sentimentos. É a isto que se convencionou chamar uncanny valley ou “vale misterioso”. Resumindo, quanto mais os robots se parecem com pessoas, mais desafiante se torna a sua representação social e mais repulsa as pessoas sentem na interação com aqueles.

Se há um ponto de desenvolvimento tecnológico em que os robots se podem parecer ao máximo com os seres humanos, esse ponto é agora. E é precisamente esse ponto que está a gerar desconforto. E ao expormos o programador do chatbot ao reconhecimento de que está a ser vítima do seu próprio sucesso, cria-se um paradoxo que, pelo menos até agora, a ciência parece não conseguir ultrapassar.