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Agricultores do Norte queixam-se de falta de planeamento para situações de seca

Com uma seca que dura já há três meses, com uma expressão maior na região de Trás-os-Montes, e que se irá agravar se as próximas semanas continuarem a não trazer chuva, os representantes do setor no Norte do país dizem que a situação “ainda não é alarmante”, mas estão descontentes com a falta de soluções.
19 Janeiro 2022, 17h04

Algumas associações de agricultores do Norte queixam-se da falta de planeamento e atenção que é dada pelo Governo e, em época eleitoral, pelos candidatos, à ameaça cada vez mais real da falta de água para o setor.

Com uma seca que dura já há três meses, com uma expressão maior na região de Trás-os-Montes, e que se irá agravar se as próximas semanas continuarem a não trazer chuva, os representantes do setor no Norte do país dizem que a situação “ainda não é alarmante”, mas estão descontentes com a falta de soluções.

O diretor da Associação dos Agricultores e Pastores do Norte (APT), João Morais, lamenta que, em tempo de campanha eleitoral, ainda não tenha visto “nenhum candidato com grande preocupação acerca das questões agrícolas”.

“A nossa ministra também não se ouve. Há aqui uma falha em toda a linha”, reforça.

Em declarações à Lusa, o engenheiro agrícola lembra que foi criada a Comissão Permanente de Prevenção, Monitorização e Acompanhamento dos Efeitos da Seca, em 2017, mas que esta não se tem reunido.

“Esta comissão devia reunir para prevenir ou antecipar problemas futuros, e não existe”, sublinha.

O dirigente reconhece que há algumas medidas importantes, como o recentemente publicado incentivo aos regadios tradicionais, “mas a carga burocrática” e o facto de ser necessário avançar com as verbas, mesmo em projetos financiados a 100%, desmotivam os agricultores.

Para o diretor-geral da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP), Firmino Cordeiro, vive-se uma “fase extremamente delicada” e só há “uma solução para isto”: “Temos de reservar água, fazer barragens e seguir o exemplo do grande Alqueva”.

“Já devíamos ter tido esta preocupação há mais tempo, há alguns bons anos a esta parte, e não termos estes problemas ideológicos, quase aberrantes, contra a guarda da água”, defende.

O agricultor considera que os “governantes têm de ter essa capacidade, junto de Bruxelas, para dizer o que é que se passa em Portugal, qual é a realidade geográfica do país”.

“Daqui por alguns anos a esta parte, com as previsões que estão em cima da mesa, corremos o sério risco de o abandono e a desertificação de muitas regiões do país ser ainda mais marcante”, vinca.

O dirigente da AJAP adianta que não é preciso “fazer barragens em todo o lado”, mas defende a necessidade de “ter algumas mega-barragens que alimentem as outras, e depois, seguir a regra da otimização, da utilização para níveis mínimos, mas que mantenha a vida e a capacidade produtiva das plantas”.

Firmino Cordeiro lamenta a gestão que é feita das barragens existentes, lembrando que, no Norte do país, há “uma barragem muito grande, chamada a Barragem do Baixo Sabor, que tem um quinto da capacidade de armazenamento da Barragem do Alqueva — e um quinto é muita coisa — e não há um litro de água que sirva para regar, porque os senhores negociadores fizeram aquilo que fizeram”.

A barragem em questão está entre as seis infraestruturas da EDP vendidas ao consórcio liderado pelo grupo francês Engie, por 2,2 milhões de euros, no final de 2020.

“Com este abandonar do nosso território e das nossas potencialidades, muito sinceramente, estamos a hipotecar [o futuro] e acho que vamos ter de viver em Lisboa, Porto e algumas cidades e abandonar o resto do país”, atira o agricultor.

João Morais reconhece a importância das barragens e acredita que “o futuro passará pela agricultura de precisão”, mas alerta que o “país é muito desigual”.

“Normalmente, quando se fala em agricultura, fala-se nos latifúndios, com agricultura mecanizada, especializada, que é a Sul do Tejo”, disse.

No Norte, a situação é diferente, com “pequenas parcelas e agricultores bastante envelhecidos”.

O dirigente da APT destaca que a associação assume esse papel de “conversar com os agricultores, chamar à atenção para todas essas situações”, mas que nem sempre há abertura para aplicar as soluções.

A solução para o problema da falta de água “pode passar pela construção de novas barragens, agricultura de precisão e o melhoramento dos sistemas de regadio, porque, quanto menor o desperdício de água, melhor”.

“Quando começar a falhar água nas torneiras, só aí é que a população se vai aperceber que andamos a desperdiçar água que podia ser utilizada para outras situações, criando reservatórios”, prevê João Morais.

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