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António Ribeiro: “OE 2020 não tem nada para estimular a poupança”

Salários baixos e elevada tributação sobre produtos de aforro explicam a baixa taxa de poupança das famílias portuguesas, que continua muito longe da média da zona euro.
26 Janeiro 2020, 18h16

Há pelo menos dois anos que a Deco Proteste tem alertado o poder político para a baixa taxa de poupança das famílias portuguesas. É uma tendência que tem de ser invertida. Afinal, como frisou António Ribeiro, analista financeiro desta instituição, ao Jornal Económico, “a poupança também ajuda à economia”.

A parte do rendimento disponível que os portugueses canalizam para a poupança coloca Portugal na cauda da Europa. É um índice no qual o país é ‘um mau aluno’, especialmente quando comparado com a zona euro, onde a média da taxa de poupança tem vindo a aumentar. “Em 2009, a média da taxa de poupança na zona euro era de 11,9% e agora ascende aos 13,2%”, disse António Ribeiro.

“Em Portugal continuamos muito abaixo da média da Europa. Em 2019, a média nacional era de 4,5%, mas em maio o Instituto Nacional de Estatística alterou a base de referência e, por isso, a taxa de poupança aumentou para 6,2%”, explicou o analista financeiro da Deco Proteste. “Na Suécia e na Alemanha está próxima dos 20%”, adiantou António Ribeiro.

A política monetária expansionista do Banco Central Europeu tem subjacente baixar as taxas de juro e isso tem repercussões na poupança das famílias portuguesas, porque incentivou os bancos comerciais a baixar as remunerações (os juros) oferecidas aos aforradores em produtos de poupança, como os depósitos à ordem.

António Ribeiro explica que, em Portugal, “o montante aplicado em depósitos a prazo diminuiu, enquanto o montante em depósitos à ordem aumentou”.

“Isto é um perigo porque, se deixamos o dinheiro numa conta à ordem, o dinheiro gasta-se [com mais facilidade]”, argumentou o analista financeiro da Deco Proteste. E, numa altura em que “o consumo e o endividamento têm crescido”, aumentar a taxa de poupança das famílias portuguesas ganha uma importância ainda maior.

 

Elevada tributação penaliza poupança dos portugueses
Sem esquecer que parte do problema se explica com “mais salário”, o analista financeiro da Deco Proteste chamou a atenção para o impacto no nível de aforro dos portugueses resultante do tratamento fiscal dado pelo Estado aos produtos de poupança, que dão origem a rendimentos de capitais. São os casos, por exemplo, dos depósitos à ordem ou a prazo, dos certificados de aforro ou do tesouro, e também fundos de investimento.
O Código do IRS qualifica-os como “Rendimentos de Categoria E” e aplica-lhes, regra geral, uma taxa liberatória de 28%.

“Há um elevado imposto sobre o aforro”, salientou António Ribeiro. “Até 2010, a taxa liberatória [sobre os produtos de poupança] era de 20%. Depois, com a crise, foi aumentando progressivamente para 28%. Passou a crise, mas a taxa mantém-se”, alertou o analista financeiro da Deco Proteste.

Neste capítulo, Portugal compara mal com a Europa uma vez mais. “Na maior parte dos países da União Europeia esta taxa está abaixo dos 28%. Por exemplo, na Bélgica, só se paga imposto a partir de determinado valor”, explicou António Ribeiro.

 

Poder político não ouve reivindicações da Deco
A Deco tem-se esforçado a alertar para o problema da baixa taxa de poupança junto do poder político e apresentou sugestões para o resolver. “Há cerca de dois anos que temos vindo a insistir. Já enviámos cartas para o Governo a alertar” para a baixa taxa de poupança das famílias portuguesas, declarou o analista financeiro da Deco Proteste. “O Ministério das Finanças e os partidos políticos responderam que iam ter em conta [esta situação]”, revelou António Ribeiro.

Além disso, “perguntámos aos partidos como encaravam o problema e que medidas iriam adotar. Todos disseram que a poupança é muito importante. Mas a verdade é que o Orçamento do Estado para 2020 não tem nada para estimular a poupança”, sublinhou.

A Deco Proteste indicou algumas reformas que se poderiam fazer com o objetivo de aumentar os níveis de poupança das famílias portuguesas. À cabeça surgiu a “diminuição da taxa de imposto [sobre os produtos de poupança]”, disse António Ribeiro. “Ou então, fazer como a Bélgica”, adiantou.

O analista financeiro da Deco Proteste defendeu ainda a reinvenção das contas-poupança. “Já só existe a conta-poupança-reformado e a conta-poupança-habitação. É preciso revitalizá-las. Por exemplo, uma conta-poupança para o curto prazo para emergências”, disse António Ribeiro.

Outra medida passaria pela criação de “produtos mais adequados às taxas de juro e às condições de mercado atuais”, explicou o analista financeiro da Deco Proteste.

E que produtos seriam esses? “Os certificados de aforro estão indexados à Euribor, que está negativa. Poder-se-ia, por exemplo, criar produtos indexados a uma taxa fixa”, sugeriu António Ribeiro.

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