Por estes dias, está em risco de desaparecer as Alagoas Brancas, uma das últimas zonas húmidas da região do Algarve. Há cerca de duas semanas a Câmara Municipal de Lagoa, liderada por Luís Encarnação, indiferente à relevância ecológica do local que deu o nome à cidade, deu o aval, ao renovar o alvará do promotor Edifícios do Atlântico, SA., para que as máquinas avançassem com o processo de terraplanagem. Tudo isto ao arrepio dos apelos feitos ao longo de anos pelas organizações não-governamentais de ambiente, de diferentes especialistas e do movimento cívico “Salvar as Alagoas” e sem que tivesse havido lugar a uma avaliação de impacte ambiental.

Quando 77% dos habitats relacionados com as zonas húmidas de Portugal se encontram degradados, o betão e os interesses económicos que lhe estão subjacentes não podem continuar a falar mais alto sob pena de estarmos a hipotecar irremediavelmente o futuro de todos nós.

As Alagoas Brancas destacam-se de entre um território retalhado como resultado de anos de um crescimento desenfreado que vem pressionando os ecossistemas em nome de um turismo de qualidade duvidosa e cuja sustentabilidade deixa muito a desejar. Apesar de apregoarmos lá fora, que estamos comprometidos com a promoção da sustentabilidade e a proteção ambiental, dentro de portas, aquilo a que assistimos é ao desaparecimento de ecossistemas e da biodiversidade.

Para além de estar em causa o desaparecimento de uma vasta variedade de espécies, nesta que é uma das regiões que se debate com o problema da escassez de água, a destruição das Alagoas Brancas é também estar em contraciclo com o combate às alterações climáticas, dado que as zonas húmidas constituem uma proteção natural contra inundações e são importantes sumidouros de carbono.

Não se compreende nem é aceitável que, com tanto conhecimento científico produzido, quem decide teime em trilhar um caminho que nos está a conduzir a passos rápidos para um ponto de não retorno. Tão pouco se compreende que seja este o legado que a autarquia de Lagoa queira deixar às gerações mais jovens: o legado do betão, onde não poderão observar aves como a Íbis-preta, o Caimão ou o Colhereiro, entre tantas outras. Espécies que poderiam justificar um estatuto de proteção das Alagoas Brancas.

Casos como o das Alagoas Brancas, conduz-nos também a outro ponto de grande relevância: a do reconhecimento do capital natural (florestas, rios, oceanos, pantanais e outros ecossistemas) como valor económico de um país, com vista à criação de um sistema de contabilidade económica – contabilidade do ecossistema. Urge alterar o atual paradigma económico, assente no lucro financeiro de curto prazo, para um paradigma que reflita na economia o real valor dos bens e dos recursos naturais.

Lutar pela preservação das Alagoas Brancas, pela sua justa preservação e classificação visando a sua proteção, está já nas mãos do Ministério Público. Mas não nos esqueçamos que está também nas mãos de todos e cada um de nós, porque quando uma autarquia ou uma qualquer outra entidade entende destruir um Bem Comum, somos todos quem perde.