Apesar da vitória nas eleições legislativas e da maioria de deputados eleitos, o próximo governo socialista continuará com o mesmo primeiro-ministro e continuará a ser minoritário.

Pode ser um novo governo, mas o próximo governo não é novo. É um “remake” do anterior. De tal forma que a maior parte dos seus membros se manterá. Mesmo que alguns possam mudar de pasta, esgotado que está o seu desempenho nas funções que exerceram. E também a fórmula governativa não diverge substancialmente da anterior.

Aumentou o número de deputados socialistas, mas o condicionamento político é o mesmo: o PS, sem maioria parlamentar, tem medo confesso da ação pública e dos jornais. O primeiro-ministro demonstra enorme incómodo face à eventualidade de confrontação pública, que possa materializar-se em agitação política.

Daí que a alteração da composição do Parlamento pouco vá alterar o processo de decisão, com ou sem acordo escrito com os partidos de esquerda. Nem a deputada esquerdista do Livre vai condicionar o Governo, como o deputado liberal de direita não fará tremer o comportamento do executivo socialista.

António Costa está ciente do período difícil que tem pela frente na primeira metade deste mandato. Passará por cima das presidenciais, fazendo-se de morto. E com a justificação de que no primeiro semestre de 2021 estará no centro do furação europeu, com a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia e as eleições autárquicas no final do segundo semestre, o PS não pode cometer os mesmos erros do iníquo governo Guterres, do qual fez parte. Mas sabe que chegará a esse momento desgastado de políticas e ministros.

A verdadeira remodelação do Governo será feita nessa altura. Até lá, mantém o ministro das Finanças, que abrirá ligeiramente a torneira do investimento para calar analistas, empresários e alguns setores políticos. E mantém o núcleo duro daqueles em quem confia, tal como manterá por perto os que sonham suceder-lhe. Só não mantém aqueles que tinham laços familiares entre si.

No mandato anterior, num momento de grande encenação e para ilustrar um novo programa de modernização administrativa, o primeiro-ministro exibiu orgulhosamente uma vaca voadora, símbolo justificativo de tornar possível o impossível.

O “simplex” versão 2015-19 afinal mostrou-se com resultados confrangedores, traduzido em longas filas para renovar o cartão do cidadão, meses de espera pelo passaporte, atrasos inexcedíveis nas listas de espera em consultas ou cirurgias. E das promessas então feitas, nem o papel desapareceu da administração pública, nem as viaturas de serviço público saíram das cidades. Conclusão refletida no elenco do novo Governo, onde esperam emendar a mão dos erros cometidos, nem sempre bem denunciados, nunca assumidos.

Do programa simplificado de 2016 ficou apenas a vaca, que continua sem voar. Que é retirada de circulação política e do programa de governo por reivindicação do PAN. Nas asas deste bovino imaginário se ilustra a política encalhada do próximo Governo.

Com a mesma estratégia cinzenta e os mesmos governantes, militantes do núcleo duro de António Costa, ensaiando não cometer os mesmos erros cometidos pelo governo socialista do qual fazia parte como ministro da Justiça, e ansiando que não haja uma nova crise, para a qual não preparou o país. E por essa altura desejando que haja uma crise, para encontrar uma justificação para desculpar o Governo, antes de o país voltar a estar em reconhecida crise.