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As conversas privadas e vídeos que meteram António Costa em maus lençóis

A conversa “off the record” de sete segundos que está a gerar uma onda de críticas a António Costa não foi a primeira em que o líder do Executivo socialista deixou escapar declarações menos simpáticas, julgando que não estava a ser gravado. Dos insultos a Nuno Melo às críticas ao jornalismo, passando pela fúria em plena campanha, são vários os momentos captados pelas câmaras ou microfones, que António Costa preferia que não tivessem acontecido.
  • António Pedro Santos/Lusa
25 Agosto 2020, 18h00

Sete segundos de conversa em off, onde o primeiro-ministro, António Costa, aparece a chamar de “cobardes” aos médicos envolvidos no caso do surto de Covid-19 em Reguengos de Monsaraz, foram o suficiente para fazer rebentar a nova polémica no Governo. Mas esta não é a primeira vez que o líder do Executivo socialista deixa escapar declarações menos simpáticas julgando que não estava no ar, quando afinal estava.

“É que o presidente da ARS [Administração Regional de Saúde] mandou para lá os médicos fazerem o que lhes competia. E os gajos, cobardes, não fizeram”, ouve-se António Costa dizer num vídeo posto a circular nas redes sociais que está a indignar os profissionais de saúde, sindicatos e os partidos.

A conversa off the record terá sido gravada, após uma entrevista do primeiro-ministro ao semanário “Expresso”, que veio demarcar-se da divulgação ilegal do vídeo nas redes sociais. Segundo a direção do semanário, trata-se de “uma gravação amadora de um ecrã de computador, que reproduz uma recolha de imagens de uma conversa off the record, privada”, que “foi divulgada nas redes sociais sem autorização e conhecimento deste jornal”.

O “Expresso” já garantiu que vai desencadear “de imediato, os procedimentos internos e externos para apurar o que aconteceu e os responsáveis pelo sucedido”. Apesar da investigação à divulgação de conversa privada, certo é que as declarações já correram as redes sociais e fizeram mossa nas relações entre o Governo e os profissionais de saúde. A Ordem dos Médicos veio inclusive pedir uma reunião urgente com o Governo, que teve lugar esta terça-feira.

As críticas ao jornalismo e o idoso que despertou a ira de António Costa 

A 13 de abril, o primeiro-ministro foi também traído pelas câmaras e microfones ligados ainda antes da entrevista à rádio “Observador”. Sem saber que já estava no ar, António Costa deixou escapar que “o jornalismo vive sempre da desgraça alheia”. A declaração foi pouco percetível ao início mas depois de ter sido questionado sobre o que tinha dito, o primeiro-ministro voltou a repetir: “o jornalismo vive sempre da desgraça alheia”.

A frase que também terá sido dita em off acabou por não ter tanta repercussão como o vídeo de uma arruada em Lisboa, durante a campanha para as eleições legislativas de 2019 do Partido Socialista (PS). António Costa estava no Terreiro do Paço, em Lisboa, no último dia de campanha, quando foi abordado por um transeunte e acusado de ter estado de férias durante os incêndios em Pedrógão Grande, no verão de 2017.

A acusação gerou um momento de grande tensão. O primeiro-ministro e secretário-geral do PS negou as acusações do transeunte – que mais tarde se veio a identificado como um ex-autarca do CDS-PP – e enfurecido chamou “mentiroso” ao idoso. “Isso é mentira (…) no dia 18 de junho eu estava lá. Mentiroso provocador”, respondeu António Costa, que acabou por ter de ser agarrado pelos membros do corpo de segurança e afastado à força.

Questionado pelos jornalistas sobre o que tinha motivado aquele momento de tensão, António Costa afirmou: “Devia ter reagido mais calmamente? Seguramente que sim, mas não é por ser político que deixo de ser uma pessoa de carne e osso e também tenho uns limites quando me atacam com uma mentira. Foi um ataque à minha honra e eu não admito ataques à minha honra”.

Mais tarde, o PS anunciou que iria apresentar uma queixa-crime por difamação contra o autor das afirmações e uma “contra terceiros”. O CDS-PP veio, no entanto, rejeitar e repudiar veementemente “qualquer insinuação” de que teria orquestrado o incidente. “Se algum partido ou líder quer desculpar uma atitude menos refletida, não procure no CDS uma justificação para o que é injustificável”, afirmou o CDS-PP, em comunicado.

Ainda durante a campanha para as legislativas de 2019, a 25 de setembro, António Costa anunciou aos jornalistas o cancelamento de uma arruada na região do Algarve, que constava na agenda inicial da partido. Acontece que António Costa foi na mesma para as ruas de Faro, mas sem jornalistas por perto. O secretário-geral socialista acabou por ser apanhado por uma equipa da rádio “Antena 1”, que estava em reportagem no local.

As escutas que apanharam o primeiro-ministro e o insulto a Nuno Melo

Em março de 2018, o primeiro-ministro foi apanhado nas escutas telefónicas efetuadas no âmbito das investigações ao caso “O Negativo”, que envolvia suspeitas no negócio da venda de plasma humano aos hospitais públicos portugueses. Segundo a revista “Sábado”, a Polícia Judiciária (PJ) terá interceptado 122 escutas telefónicas envolvendo António Costa, mas sem relevância criminal.

Ainda antes de tomar posse como primeiro-ministro, António Costa já era notícia pelo envio de uma SMS polémico a um jornalista do “Expresso”, João Vieira Pereira, atual diretor do semanário. Na SMS, enviada a 25 de abril de 2016, o então secretário-geral do PS acusava João Vieira Pereira de confundir a “liberdade de opinar e a imunidade de insultar” e “arrogar a legitimidade de julgar o carácter de quem nem conhece”.

“Saberá que, em tempos, o jornalismo foi uma profissão de gente séria, informada, que informava, culta, que comentava. Hoje, a coberto da confusão entre liberdade de opinar e a imunidade de insultar, essa profissão respeitável é degradada por desqualificados, incapazes de terem uma opinião e discutirem as dos outros, que têm de recorrer ao insulto reles e cobarde para preencher as colunas que lhes estão reservadas”, escreveu na SMS.

“Quem se julga para se arrogar a legitimidade de julgar o carácter de quem nem conhece? Como não vale a pena processá-lo, envio-lhe este SMS para que não tenha a ilusão que lhe admito julgamentos de carácter, nem tenha dúvidas sobre o que penso a seu respeito. António Costa”, acrescentou. A mensagem era suposto ter sido privada mas acabou por ser tornada pública e foi notícia em alguns jornais.

Três anos antes disso, António Costa, na altura presidente da Câmara Municipal de Lisboa, foi apanhado, no início do programa Quadratura do Círculo, da SIC Notícias, a 12 de Outubro de 2012, a criticar o eurodeputado do CDS-PP Nuno Melo. O programa já estava no ar, mas nenhum dos intervenientes tinha ainda falado, quando o autarca afirmou: “O Nuno Melo é um queque malcriado”.

A afirmação foi feita com conversa com Pacheco Pereira e Lobo Xavier, no início do programa, ainda antes de o moderador Carlos Andrade dar início ao debate. António Costa foi interrompido pelo moderador, mas o programa já estava a ser transmitido em direto, sem margem para cortes.

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