Este fim de ano é especial. Nos EUA, onde a Covid faz estragos, o Dow Jones – criado em 1884 – ultrapassou pela primeira vez os 30 mil pontos terça-feira da semana passada. É verdade que logo depois caiu, para acabar o mês pouco abaixo desta marca. Subiu 5% desde o início do ano, nada ao lado dos 12,5% do S&P500 e dos mais de 30% do Nasdaq, o que se deve ao Dow ser um índice velho, desalinhado da realidade atual – não inclui Google, Facebook ou Amazon, por exemplo.

Há, pois, um otimismo que não se vê na economia, mas que traduz a expectativa de recuperação económica forte para 2021 e seguintes, estimulada pela vitória de Biden e pela escolha de Janet Yellen para o Tesouro, ela que é conhecedora da vida das empresas e que se espera tome medidas que as suportem e reduzam o número de falências provocadas pela crise.

Para a Europa, o cenário também é mais positivo, mas os desafios são vários, a começar pela tarefa de Sísifo que são as negociações do Brexit, face à intransigência britânica que está a exasperar até Merkel. E take back control das águas territoriais para vender 70% do pescado aos mesmos a quem se bate com a porta na cara é pôr em causa 12 mil postos de trabalho.

A derrota de Trump fez mossa nos populistas europeus, e “the brexiteer dead wood needs to be cleared out”: Boris fez um reboot, fora com Cummings e Cain e anunciou uma “green industrial revolution”, um plano de 12 mil milhões de libras. O custo será duplo: alienou o ERG e parte dos tories radicais, e vai perder parte do que ganhou nas eleições no “red belt”, menos sensível à aposta verde e que com ela ganhará pouco.

A segunda questão será interna: como tratar Orbán e Kaczynski, que vetaram a proposta de orçamento comunitário e do fundo de relançamento. Soros propôs que se lhes batesse onde dói mais: na carteira. Para ele, as transferências comunitárias deviam ser feitas para as autoridades locais, muito mais democráticos que o governo. Nalgum momento a União terá que tratar este problema de frente, sob risco de manter dentro de si forças de desagregação. Não se pode esperar coesão e solidariedade de quem não vive e não quer viver sob estes valores.

Finalmente, último grande problema para 2021, o que fazer quanto à China, quando os EUA regressam ao multilateralismo. A deriva é clara, Hong Kong mostrou que velhos compromissos estão a dar lugar a novas ambições: Carrie Lam fez expulsar 4 membros da oposição do Conselho Legislativo e fomentou a demissão dos 15 outros; agora diz-se ‘excited’ com a maior eficiência na aprovação das leis. Em suma, o “um país, dois sistemas” acabou e já não há sequer a preocupação de simular democracia.

A Austrália toma posição a favor de uma investigação sobre a origem da Covid e o porta-voz do MNE chinês mostra uma fotografia falsa de um soldado australiano a abater um afegão. Como qual Trump não estava errado em tudo.