Em 2018 comemoraram-se 200 anos do nascimento de Karl Marx. Esta efeméride foi praticamente esquecida pela comunicação social dominante. E não fossem as iniciativas promovidas por todo o país pelo PCP, nomeadamente com a realização da Conferência Karl Marx – “Legado, intervenção, luta. Transformar o Mundo” a 24/25 de Fevereiro na Voz do Operário (aliás também votada ao silêncio pela generalidade dos media) e mais algumas (também) escassas actividades académicas, os 200 anos de Marx e a sua obra não teriam tido qualquer visibilidade pública.

A que vem este arrazoado sobre águas já passadas? É apenas para lembrar e registar que nessa espantosa omissão de jornais, rádios e televisões ditos de referência pesou como chumbo a ausência de qualquer esforço, da mínima lembrança para ouvir sobre o tema Marx, Barata Moura. Que não foi só o cantautor de músicas infantis deliciosas no dealbar dos dias de Abril.

José Barata Moura, Professor Catedrático de Filosofia da Universidade de Lisboa, de que foi Reitor entre 1998 e 2006, tem um trabalho ímpar sobre Marx. Quer de reflexão quer de tradução. Destaque-se como acontecimento científico, cultural, histórico e político da mais alta relevância a publicação em 2017 do Tomo VIII do Livro Terceiro de “O Capital”, com a tradução de Barata Moura, finalizando a edição sob a sua direcção e de Francisco Melo, dos três Livros e oito Tomos para a Editorial Avante, da monumental obra de Karl Marx(1).

Pela primeira vez em Portugal era publicado todo um texto teórico fundamental para compreender o sistema capitalista. Um texto decisivo para a procura dos caminhos para a sua superação.

Não é possível hoje compreender em todas as suas dimensões o capitalismo, as suas dinâmicas e os seus desenvolvimentos históricos sem a ferramenta teórica de “O Capital” de Marx. E não é preciso ser adepto do socialismo e do comunismo para o perceber. Não é certamente por acaso que, no centro do mundo capitalista, nos EUA, ele continua a ser texto de estudo em prestigiadas universidades. Ou que, certamente reflectindo o momento de crise do sistema, “Karl Marx é um dos autores que mais vende na categoria ‘Free Enterprise’ da Amazon”(2).

No momento em que a situação económica, social, política na Europa e no mundo exprimem, reflectem as profundas contradições e impasses, da crise sistémica do sistema capitalista, que explicação poderá haver para o silenciamento mediático de Barata Moura? Ser marxista? Ser comunista?

Só uma intensa e preconceituosa cegueira ideológica, só o perfilhar de uma ignorância sectária e tacanha, só o anti-comunismo cavernícola, que vai ganhando espaço nos media dominantes, pode explicar o que aconteceu em 2018 com o forçado “esquecimento” e “silêncio” mediáticos de Barata Moura.

Ou será que o “espectro” – “o espectro do comunismo” – referido na abertura do Manifesto Comunista por Marx e Engels, em 1872, continua vivo e a afligir as almas piedosas do capital?

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

 

(1) A tradução dos três primeiros Tomos do Livro Primeiro teve a participação de outros tradutores.   

(2) Referido por Daniel Zamora, “Lamentar as desigualdades, ignorar as suas causas”, M. Diplomatique, Janeiro 2019.