Dada a excepcional incerteza do período que vivemos, é muito difícil para um banco central actuar na medida correcta. Por isso, pode-se dizer, antecipadamente, que o Banco Central Europeu (BCE) vai errar. Só que, na actual conjuntura, é mil vezes preferível errar por excesso do que por defeito.

Em geral, as políticas de estabilização têm desfasamentos, de dois tipos. O chamado desfasamento interno, entre a tomada de consciência de um problema e as medidas de política; e o desfasamento externo, entre a aplicação das medidas e as suas consequências práticas. Normalmente, a política orçamental tem um desfasamento interno longo, em que as medidas precisam de aprovação parlamentar e de aguardar pela entrada em vigor de nova lei, o que demora o seu tempo; já o segundo desfasamento é curto, dado que, uma vez em vigor, começa logo a produzir efeitos. É evidente que, em períodos excepcionais, como o que vivemos, a política orçamental também pode ser muito mais rápida, e foi isso que se verificou em alguns países, mas não em Portugal, onde se registou um atraso incompreensível.

Na política monetária, os desfasamentos têm uma duração inversa. Um banco central consegue tomar medidas no próprio dia em que surge uma novidade; mas a sua transmissão à economia é especialmente lenta: demora três a quatro trimestres a ter efeito sobre o PIB e seis a oito trimestres a ter impacto sobre a inflação.

Por isso, é incompreensível o argumento que se tem ouvido ao BCE, de querer esperar para aferir da verdadeira situação da condição económica na zona euro. A situação é muito má, que diferença faz se a recessão em 2020 será de 8% ou de 12%? Qualquer medida do BCE chegará sempre tarde.

Se o BCE agir por defeito, teremos uma retoma mais lenta, mais desemprego, menor crescimento económico, maior risco de inflação negativa, maiores problemas nas contas públicas.

Dada a escassez de instrumentos eficazes à disposição do BCE é muito difícil de conceber que a sua acção possa ser por excesso, mas vamos admitir que ocorreria essa situação. Neste caso, teríamos uma retoma mais rápida, menos desemprego, maior crescimento económico, risco de inflação acima dos 2%, menores problemas nas contas públicas.

Dado que, nos últimos anos, com forte crescimento económico e desemprego em clara queda, o BCE nunca conseguiu que a inflação subisse para valores próximos da sua meta de “próxima mas abaixo dos 2%”, tem que se reconhecer que, na actual conjuntura, o risco da inflação superar os 2% é praticamente nulo. Ainda assim, admitamos que, por um improvável acaso, esse fenómeno ocorria. Então, o BCE teria todos os instrumentos do mundo para fazer baixar a inflação: inverter a expansão quantitativa, subir as taxas de juro, etc. Ou seja, mesmo que o improvável problema ocorresse, ele seria facílimo de corrigir.

Em resumo, o BCE não deve esperar e deve usar todos os instrumentos ao seu alcance para acelerar a retoma, mesmo correndo o risco de agir por excesso.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.