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BE quer cobrar “prestação patrimonial” aos bancos sobre Ativos por Impostos Diferidos

Em causa estão 3,8 mil milhões de euros em Ativos por Impostos Diferidos que foram criados em 2014 e ainda “hoje perduram no balanço dos bancos”, embora o “regime especial aplicável” a esses ativos tenha sido revogado em 2016. “Se o Estado presta esta garantia e assume este risco, então deve ter uma remuneração efetiva por este serviço prestado à banca”, defendem os bloquistas.
23 Março 2019, 15h00

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) apresentou ontem na Assembleia da República um projeto de lei que visa criar “a prestação patrimonial sobre os Ativos por Impostos Diferidos (AID) abrangidos pelo Regime Especial aprovado pela Lei n.º 61/2014, de 26 de agosto”. Em causa estão 3,8 mil milhões de euros em AID que foram criados em 2014 e ainda “hoje perduram no balanço dos bancos”, embora o “regime especial aplicável” a esses ativos tenha sido revogado em 2016. “Se o Estado presta esta garantia e assume este risco, então deve ter uma remuneração efetiva por este serviço prestado à banca”, defendem os bloquistas.

“Em 2016 pôs-se fim ao regime especial aplicável aos AID, aprovado pela Lei n.o 61/2014, de 26 de agosto. Embora este tenha sido um passo importante, o problema do stock entretanto criado mantém-se, e, o seu impacto ainda será sentido durante muitos, muitos, anos pois sabemos que hoje perduram no balanço dos bancos 3,8 mil milhões de euros de AID criados na altura e abrangidos por este regime”, começa por se contextualizar na exposição de motivos do projeto de lei.

“Os AID são ativos que surgem pelo facto de, em Portugal, existirem regras diferentes para a admissão de perdas por imparidade, na contabilidade e na fiscalidade, sendo mais estritas nesta última por forma a evitar o empolamento de perdas com vista à redução do imposto. A diferença entre estes dois registos, teoricamente, leva ao pagamento de um imposto (IRC) superior no ano em que esta se verifica, constituindo-se este valor como AID para posteriormente, este ser deduzido ao montante a liquidar de IRC no ano da aceitação fiscal do registo da imparidade, ou nos 5 anos seguintes, em caso de prejuízo fiscal esse ano (como qualquer outro prejuízo fiscal em IRC)”, explicam os deputados do BE.

“Com a crise financeira, o stock de perdas por imparidades e de AID teve um crescimento explosivo, tornando-os uma parte substancial dos ativos e do capital dos bancos em Portugal. Em 2013, é publicado o Regulamento UE n.o 575/2013, que dita que os AID por imparidade passam a ser desvalorizados no apuramento dos rácios de capital dos bancos, pois é entendido que dado o valor enorme de AID existente em alguns bancos e a perspetiva negativa de lucros no médio-prazo, não seria viável ‘escoar’ o stock de AID a cinco anos e, por conseguinte, a perspetiva de recuperação era nula”, recordam. “Esta decisão colocava em risco os rácios de capital de vários bancos portugueses, artificialmente sustentados pelos stocks de AID. Neste contexto, foi criado pelo Governo PSD/CDS, através da Lei n.o 61/2014, o designado regime especial aplicável aos ativos por impostos diferidos. Este regime veio consagrar uma garantia do Estado sobre os AID, de forma a que estes pudessem ser aceites para o apuramento dos rácios de capital – denominando-se assim AID ‘elegíveis’”.

“Em Portugal revogou-se o regime especial de 2014, limitando a sua aplicação ao stock existente a 31 de dezembro de 2015, e o Governo quer rever agora às regras fiscais, de modo a aproximar o momento do registo contabilístico e da dedução fiscal das imparidades. No entanto, e até esta data, os bancos registaram milhares de milhões de imparidades. Não pagaram IRC porque apresentaram prejuízo, mas mesmo assim guardaram o direito de deduzir essas perdas nos seus impostos futuros – para sempre. E mais, nos casos em que em vez de lucro registam prejuízos, podem pedir esse dinheiro ao Estado”, criticam os bloquistas.

Para o Grupo Parlamentar do BE “é muito claro que parte dos AID gerados nos anos da crise financeira, e que têm vindo a sustentar os rácios de capital dos bancos portugueses, não foram criados como qualquer contrapartida por impostos pagos nesses anos. Tão pouco configuram um direito de dedução futura, à luz das regras fiscais existentes, uma vez que não poderiam, realisticamente, ser deduzidos nos cinco anos subsequentes. Ou seja, os AID elegíveis foram uma forma pouco transparente de capitalizar os bancos portugueses diferindo para o futuro os custos para o erário público”.

“No total, estes AID elegíveis somam cerca de 3.800 milhões. Só o BCP tem quase 2.000 milhões, o que quer dizer que pode passar muitos e muitos anos sem pagar IRC”, alertam. “Em 2018 o Estado pagou ao Novo Banco 154 milhões por AID e, segundo o Tribunal de Contas, havia mais pedidos de seis bancos no valor de 632 milhões de euros”.

“Se temos de viver com estes valores, se o Estado presta esta garantia e assume este risco, então deve ter uma remuneração efetiva por este serviço prestado à banca, acompanhando um mecanismo já aplicado noutros países europeus e recomendada pela DG COMP. Para o Bloco de Esquerda isto é o mínimo que se pode e deve exigir em contrapartida”, sublinham no projeto de lei.

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