O PS que marca a minha infância e adolescência é o puro. O dos militantes que acorriam a manifestações e enchiam as secções do partido espalhadas por todo o País. Aliás, o actual líder começou a sua filiação ali, na secção do Bairro Alto, na Rua de São Marçal (hoje desactivada).

Na maior parte dos casos, eram mulheres e homens com paixão pelo partido, que nunca ocuparam qualquer cargo ou o usaram para obter um emprego. Era a poesia do gosto pela política, do debate, da discussão animada, pontuada muitas vezes pela visita dos grandes nomes do PS e não apenas em tempo de eleições internas, como acontece hoje em dia.

Foi nessas secções que muitos viram pela primeira vez televisão a cores, lá pelos idos de 1980, onde, por vezes, tomavam um café depois do jantar, algo que o tempo agitado e cada vez de menor alma matou, acabando de vez com essa ligação umbilical ao símbolo.

Por algum motivo o PS mudou o vermelho de punho erguido para um rosa moderado, mais aglutinador e menos marcadamente marxista e leninista dos seus primórdios. É essa a essência de um partido de poder que, no caso, nasceu à esquerda mas que o pragmatismo obrigou a colocar o socialismo na gaveta.

Mário Soares foi o grande líder que levou o PS para o socialismo democrático e a social-democracia, tornando-se uma das grandes referências mundiais desse espectro político, juntamente com François Mitterrand, Olof Palme e Willy Brandt.

Mas o fundador tinha, igualmente, grandes homens ao seu lado: Salgado Zenha, António Macedo, António Arnaut, Tito de Morais, entre tantos outros. Foi dele a força tranquila que levou o PS ao poder, que, depois, numa campanha épica conquistou Belém e continuou sempre a lutar pelas suas convicções, ganhando e perdendo combates porque é assim a vida.

E há Jorge Sampaio, António Guterres, José Sócrates e António Costa. Há vitórias e derrotas, conspirações (como as do sótão de Algés) ou punhaladas, como nas tragédias de Shakespeare, como aconteceu com António José Seguro.

O PS é, e continuará a ser, um grande partido se não cair em tentações hegemónicas de poder absoluto ou, num futuro próximo, abandonar a moderação e cair nos braços do extremismo de esquerda. Mas nos dias de hoje, das suas bodas de ouro, há uma certeza: o seu trunfo actual é António Costa e, pela amostra da TAP, depois dele pode ser o caos.

P.S.: já sabemos que a TAP é o Vietname deste Governo, como eu descrevi em todo este caso. Mais uma semana e continua o dossier pica-miolos de uma série de ministros. A notícia exclusiva do Jornal Económico, que dá conta de que, em resumo, se anunciou um despedimento por justa causa do ‘chairman’ e CEO da empresa em cima do joelho, sem que essa decisão estivesse blindada a indemnizações milionárias – mas que também não isenta de responsabilidades ambos os citados na indemnização de Alexandra Reis – é a prova cabal de que se andou a brincar com algo que já nos custou 3,2 mil milhões de euros e que todos os dias se deprecia com estas notícias quando se pretende a sua rápida reprivatização.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.