A preocupação em torno da subida da taxa de juro americana tem ganho peso: a taxa dos títulos do Tesouro a 10 anos aproximou-se dos 1,75%, quando era 0,51% há um ano. No epicentro está o plano de estímulos de Sleepy Joe, que alguns pensam que vai dar demasiada cafeína à economia dos EUA. Para já, o PIB cresceu uns vigorosos 4,1% anualizados no quarto trimestre de 2020. Powell e Yellen afastam a preocupação, mas os próximos tempos vão ser clarificadores, até porque a conventional wisdom dos mercados financeiros converge num ponto: “rate rises are bad”.

Uma coisa convém não esquecer: as taxas têm estado anormalmente baixas por intervenção da Fed, como medida de suporte à economia. Foi até alargada a panóplia de instrumentos monetários e o Quantitative Easing (QE), ferramenta não convencional, passou a fazer parte do portefólio corrente, não só nos EUA: em várias partes do mundo os bancos centrais impuseram juros negativos, coisa (como o QE) impensável há 20 anos atrás, na entrada do milénio e com o euro na primeira infância, altura do objetivo de orçamento equilibrado e dívida pública abaixo de 60 % do PIB. Onde isso já vai.

A subida da taxa de juro deve ser lida hoje, para citar os juristas, com as devidas adaptações. Em primeiro lugar, aproximamo-nos da normalidade, o que quer que ela seja, e das políticas expansionistas deixarem gradualmente o palco, felizmente: há um limite até onde o Estado pode intervir na economia e a dívida pública não pode crescer indefinidamente, em percentagem do PIB. Seria o comunismo por exaustão económica. Em segundo lugar, está ultrapassado o receio de os cheques criarem um frenesim gastador. Segundo um survey da Fed sobre a primeira tranche (os cheques de 600 dólares em dezembro), só 30% foi gasto, o restante foi usado a pagar dívidas (35%) e poupado (36%).

Também as descidas das bolsas não são em si negativas. Havia o receio de estar em desenvolvimento uma” bolha”, sobretudo no mercado das tecnológicas; alguma correção pode ser boa. Aqui o caso americano é diferente do internacional. O CAPE ratio de Shiller, que ajusta o rácio preço/rendimento dos efeitos cíclicos, é hoje 35 nos EUA, valor só ultrapassado duas vezes: no final dos anos 90, que levou o mercado a” arrastar-se” na década que se seguiu, e em 1929, e sabemos o que veio depois. Na Europa estamos pouco acima dos 15, nos países emergentes dos 16, perto dos 20 no Canadá. Há espaço para alguma divergência na evolução a curto e médio prazo.

A última vez que os americanos viram inflação a sério foi há 40 anos, com Paul Volcker na Fed, quando as taxas dos empréstimos subiram acima dos 20%. Hoje está-se melhor preparado, e desde a crise de 2008 que sobre a inflação se repete a história de Pedro e o Lobo. Mas nessa história, no fim, o lobo estava lá. Recomenda-se a velha atitude britânica: wait and see. Sobretudo o see.