Este fim de semana, e depois de algumas peripécias negociais que envolveram Gibraltar, o Conselho Europeu aprovou finalmente o acordo com o Reino Unido para o Brexit.

As reações foram diversas, embora podendo resumir-se a posição geral da seguinte forma: consternação pela confirmação da saída do Reino Unido da União Europeia; satisfação por essa saída poder ser feita de forma ordenada e negociada, em lugar de ser caótica e desordenada.

É importante, por agora, olhar para o acordo alcançado e perceber em que medida, a ser aprovado, vai ter implicações na vida de todos os europeus, incluindo, para já, dos britânicos. Refiro-me às consequências do acordo para a mobilidade de pessoas entre a União Europeia e o Reino Unido. Esta dimensão do acordo é também especialmente importante para Portugal, tendo em conta a relevante comunidade portuguesa que reside no Reino Unido, e o número de britânicos que vivem em Portugal e que aqui possuem investimentos, desde logo, no Algarve. Acresce ainda a questão da fronteira com a Irlanda do Norte, e a previsão de um backstop caso a ausência de controlo fronteiriço venha a revelar-se problemática durante o período transitório.

O acordo prevê a proteção do estatuto dos residentes atuais e das suas famílias, assegurando que podem continuar a beneficiar do estatuto de residência que possuem neste momento. Essa proteção abrange as suas famílias diretas. Esta medida permite descansar quase três milhões de pessoas que se encontram nessa situação. Todavia, podem já antecipar-se problemas complexos no futuro. Por exemplo, pode suceder que alguém deseje mudar de estatuto, de estudante para trabalhador, ou vice-versa. Pode suceder que alguém deseje suspender a residência por um tempo para, por exemplo, aceitar um projeto profissional noutro país, ou regressar temporariamente ao seu país de origem.

É certo que o acordo prevê um período transitório, e que a sua execução irá ainda exigir detalhes de aplicação, mas não creio que todas as dificuldades tenham sido inteiramente resolvidas.

Se é certo que a situação dos residentes atuais é a que mais preocupa os negociadores, não é menos relevante o que sucederá no futuro, isto é, como se irá processar a mobilidade de pessoas depois da entrada em vigor do acordo.

Aqui serão acordados, numa base negocial e caso a caso, acordos de vistos para fins específicos, bem como a previsão de uma isenção genérica de vistos para fins gerais, por um período limitado.

Isto levará a que, no futuro, a residência por períodos prolongados por cidadãos europeus no Reino Unido e de britânicos na União Europeia seja muito mais difícil. Isto terá impacto no investimento imobiliário, por exemplo, uma vez que este investimento se destinava, muitas vezes, a residência temporária.

Esta parte do acordo, embora não totalmente satisfatória, era inevitável, tanto mais que a pressão migratória foi um dos argumentos que levou os britânicos a votarem favoravelmente o Brexit. Neste aspeto, os negociadores europeus sempre foram muito claros: teria de existir reciprocidade.

Teremos ainda de esperar os desenvolvimentos do processo, mas, por agora, o Brexit vai mesmo acontecer e, embora ordenado, implicará uma alteração substancial da mobilidade entre a União Europeia e o Reino Unido. E esta alteração terá custos para todos, a começar pelos britânicos. É pena que só agora isto seja absolutamente claro para todos.