[weglot_switcher]

Bruxelas apela à contestação pacífica e pelos canais apropriados das eleições nigerianas

A Comissão Europeia vai continuar a acompanhar todo o processo, sustentou a porta-voz, que insistiu na necessidade de “assegurar a integridade” do processo eleitoral através de contestações pacíficas.
2 Março 2023, 13h01

A Comissão Europeia apelou hoje à contestação pacífica de todas as partes envolvidas nas eleições na Nigéria, no último sábado, e que qualquer impugnação de resultados seja feita pelos canais apropriados.

“Pedimos a todos os participantes [nas eleições de sábado] que continuem a cumprir com os compromissos que assumiram, com protestos pacíficos, e qualquer disputa deve ser endereçada pelos canais legais”, disse a porta-voz da Comissão para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, Nabila Massrali, em conferência de imprensa, em Bruxelas (Bélgica).

Massrali considerou que, apesar do “contexto extremamente exigente”, foi um “grande momento democrático” na ótica dos 150 observadores que a União Europeia enviou para acompanhar o sufrágio na Nigéria.

Bruxelas vai continuar a acompanhar todo o processo, sustentou a porta-voz, que insistiu na necessidade de “assegurar a integridade” do processo eleitoral através de contestações pacíficas.

A CENI da Nigéria, o país mais populoso e maior economia de África, declarou na quarta-feira o candidato do partido no poder, Bola Tinubu vencedor das eleições presidenciais, não obstante queixas generalizadas de alegada fraude eleitoral por parte dos principais partidos da oposição, que apelaram à anulação das eleições e à sua repetição.

Na terça-feira, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, saudou o “empenho na democracia” demonstrado pela população nigeriana, reconhecendo também o “contexto desafiante” em que se realizaram, e apelou à calma e contenção de todas as partes.

No relatório preliminar divulgado na segunda-feira, a missão de observação da UE apontou que as eleições foram celebradas “dentro do calendário previsto, mas a falta de transparência e as falhas operacionais reduziram a confiança no processo e desafiaram o direito de voto”.

Segundo o relatório preliminar, “as liberdades fundamentais de reunião e circulação foram largamente respeitadas, mas o pleno gozo destas últimas foi impedido por um planeamento insuficiente, pela prevalência da [moeda] naira, pela insegurança e escassez de combustível”, apontando ainda os eurodeputados que “o abuso do poder estabelecido por vários titulares de cargos políticos distorceu o campo de jogo e houve acusações generalizadas de compra de votos”.

Apontando que “os meios de comunicação social forneceram uma extensa cobertura das três principais campanhas”, mas “a desinformação interferiu com o direito dos eleitores a fazerem uma escolha informada no dia das eleições”, a missão da UE sublinhou que “continua a observar a recolha e o apuramento dos resultados em curso em todo o país”.

Na terça-feira, a missão da União Africana (UA) que observou as eleições gerais da Nigéria considerou que se realizaram num “ambiente transparente e pacífico”, apesar de alguns “incidentes isolados”, e lamentou a existência de numerosos atrasos.

“A missão observou que apesar do difícil ambiente económico, operacional e de segurança, as eleições foram geralmente bem administradas, numa atmosfera transparente e pacífica”, afirmou o ex-presidente queniano e chefe da missão da UA na Nigéria, Uhuru Kenyatta, numa declaração publicada no portal da organização pan-africana na internet.

Kenyatta lamentou que até 83% das mesas de voto inspecionadas por equipas da UA tenham aberto com atrasos, “devido à chegada tardia dos funcionários de votação e dos materiais de votação, bem como à lenta instalação” de tecnologia concebida para evitar possíveis irregularidades.

O chefe da missão lamentou também o baixo número de mulheres candidatas que concorreram às eleições gerais (presidenciais e duas câmaras do parlamento nigeriano), apesar de 47,5% dos mais de 93,4 milhões de eleitores registados pela CENI serem mulheres.

O relatório da UA foi divulgado no contexto de queixas de vários partidos da oposição, que rejeitaram os primeiros resultados das eleições porque a transmissão eletrónica das contagens das mesas de voto não pôde ser totalmente realizada, o que a CENI atribuiu a “problemas técnicos”.

Kenyatta instou também “todos os intervenientes a manterem o compromisso com o Estado de direito e os princípios democráticos até à conclusão do processo (eleitoral)” e a “utilizarem os canais legalmente estabelecidos” para expressar as suas queixas.

O ex-presidente da Nigéria Olusegun Obasanjo (1999-2007), que apelou ao Presidente cessante, Muhammadu Buhari, para anular as eleições e repeti-las, questionou a autenticidade dos resultados até agora fornecidos pela CENI, que colocam na liderança o candidato do partido no poder.

De acordo com os resultados divulgados pela CENI, Tinubu obteve cerca de 8,8 milhões de votos (36,6% dos boletins escrutinados), contra cerca de sete milhões (29%) para Atiku Abubakar, do Partido Democrático Popular (PDP), e cerca de 6,1 milhões (25,4%) para Peter Obi, líder do Partido Trabalhista.

Segundo os resultados apresentados esta quarta-feira por Mahmud Yakubu, presidente da CENI, foram escrutinados 24 milhões de votos válidos, o que representa uma participação de apenas 26% dos mais de 87 milhões de eleitores registados, numa abstenção muito superior à das últimas eleições, em 2019, em que, já na altura, apenas cerca de um terço dos eleitores registados acabaram por votar.

Bola Tinubu, com 70 anos, antigo governador de Lagos (1999-2007), apelidado de “padrinho” e “criador de reis”, devido à imensa influência no seio do Governo, é um ioruba (grupo étnico maioritário do sudoeste) de fé muçulmana, empresário rico, que subiu nas fileiras políticas do APC (sigla em inglês do Congresso de Todos os Progressivos) sob acusações de corrupção, ainda que nunca tenha sido condenado.

O sucessor de Muhammadu Buhari herdará uma nação flagelada pela insegurança crescente em algumas partes do país, palcos de ataques constantes de bandos criminosos, raptos de civis para obtenção de resgates, grupos ‘jihadistas’, combates intercomunitários, e rebeldes pró-independentistas.

O próximo líder da administração do país terá ainda de procurar conter a inflação desenfreada e as elevadas taxas de desemprego, apesar do estatuto da Nigéria como principal produtor de petróleo de África e a maior economia do continente.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.