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Caleidoscópio Varda de novo em Serralves

A mulher que se fez fotógrafa, cineasta e artista plástica “aterra” em Serralves, no Porto, 13 anos depois, com a exposição “Luz e Sombra” e uma retrospetiva que reúne duas dezenas de filmes.
26 Junho 2022, 15h05

O ano de 2009 vai ter aqui especial importância. Foi a última vez que Agnès Varda (1928-2019) esteve em Serralves, então com duas vídeo-instalações, “Bord de mer” (Beira-mar, 2009) e “Le Tombeau de Zgougou” (O Túmulo de Zgougou, 2006) – “o mais belo túmulo do mundo”, nas suas palavras, dedicado ao seu gato, Zgougou.

Foi também nesse ano, mais concretamente no final da tarde de dia 18 de outubro, em Lisboa, que Agnès Varda encheu a sala da Fnac Chiado, por ocasião do lançamento em DVD de dois dos seus mais emblemáticos filmes: “Cléo de 5 à 7” (Duas horas na vida de uma mulher) e “Sans toit ni loi” (Sem eira nem beira). No final, o seu sorriso suspenso e sereno, os olhos perscrutadores, a palavra solta, houve quem se aventurasse a trocar impressões, a pedir um autógrafo, a confidenciar um pensamento…

No meu caso, partilhei algumas glicínias secas num caderno com uma capa a que hoje chamamos vintage. E uma frase de Cléo. Recebi um sorriso luminoso e uma frase em troca. Está escrita numa página desse caderno. Recordo-a amiúde, com ou sem “praias de Agnès. Curiosamente, fez ainda mais sentido quando ao ver esse filme autobiográfico, “Les Plages d’Agnès”. Também foi exibido por Serralves à boleia da Festa do Cinema Francês do Porto. Lá está, em 2009.

Foi aí que conheceu pessoalmente o realizador Manoel de Oliveira. O primeiro encontro terá sido no auditório, onde conversaram, e no dia seguinte mantiveram um encontro mais informal no jardim. A mostra que agora é apresentada em Serralves arranca, precisamente, com as imagens recolhidas pela artista nesse momento, e que foram usadas na série televisiva “Agnès de ci de là Varda” (2011).

Agora, podem ser vistas duas instalações: “Uma cabana de cinema: A estufa da felicidade”, de 2018, e “Patatutopia”, de 2003. Os dois trabalhos procuram um confronto idêntico, ie,: a falsa vivacidade dos girassóis e a deterioração das batatas. Ou seja, remetem para a imagem estereotipada da felicidade e para a representação alegórica da velhice. Um olhar sempre desconcertante e a derrubar preconceitos.

A acompanhar a exposição, a Fundação de Serralves – Casa do Cinema Manoel de Oliveira editou uma publicação bilingue (português/inglês), profusamente ilustrada, bem como a reportagem fotográfica realizada por Agnès Varda em Portugal, em 1956, nunca antes apresentada na sua totalidade, com fotografias que Varda tirou no Porto Nazaré, Póvoa do Varzim, Évora e Lisboa.

Ao longo da sua vida, a faceta de cineasta nunca a abandonou, traduzindo-se na realização de cerca de cinco dezenas de filmes, entre documentário e ficção, curtas e longas metragens e séries para televisão, dedicando o seu olhar atento a diferentes causas e temáticas, assim como abordagens estéticas. Recebeu os mais importantes prémios de cinema, entre os quais o Leopardo de Honra do Festival de Locarno, a Palma de Ouro de Carreira do Festival de Cannes e o Óscar honorário.

A curadoria de “Luz e Sombra” é de António Preto, Diretor da Casa do Cinema Manoel de Oliveira, com coordenação de Carla Almeida. A programação de cinema está a cargo de Ricardo Vieira Lisboa.

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