Há quase um ano, em abril de 2019, depois de uma recuperação do mercado accionista da espécie relâmpago (o MSCI World Index recuperou mais de 20% nos primeiros quatro meses de 2019, depois de ter caído quase 15% nos últimos três meses de 2018), escrevi que os investidores se encontravam numa posição relativamente difícil. Com os índices accionistas novamente perto de máximos na altura e as taxas de juro perto de mínimos, tudo parecia “caro”, pelo menos segundo os padrões de avaliações históricos.

Se há quase um ano este era o sentimento, imagine-se hoje, depois do MSCI World Index ter subido mais de 10% face aos níveis de abril de 2019, e da taxa de juro implícita do principal índice obrigacionista em euros (Bloomberg Barclays Euro-Aggregate Index) ter caído mais de 30 p.b. nesse período, para uns míseros 0,13% actualmente. Ao longo dos últimos meses, a generalidade dos activos financeiros globais ficou efectivamente mais cara, e isso tornou a situação dos investidores ainda mais “bicuda”.

Na altura apontei que, apesar da situação bicuda em que se encontravam, seria importante que os investidores se habituassem a níveis de avaliações “careiros” de um ponto de vista histórico. Hoje, correndo o risco de me tornar demasiado repetitivo e de, ao contrário de há nove meses atrás, ser menos oportuno nesta análise, acho útil retransmitir a perspectiva que transmiti na altura.

Ainda que as avaliações da generalidade dos mercados financeiros gerem algumas vertigens, estas avaliações “altas” são a consequência do novo regime de taxas de juro “quase zero” que, por vários motivos, deverá continuar vigente no médio prazo. Como tal, é natural que as avaliações de outras classes de activos (para além das obrigações) se ajustem a essa realidade. É o que está a acontecer não só nos mercados accionistas, como no imobiliário, e nos mercados de capital privado como os de private equity ou de venture capital.

É verdade que este ajustamento à realidade taxas de juro “quase zero” não é isento de riscos – vários falam da bubble in everything como forma de exprimir a perplexidade perante tais níveis de avaliações. Se os investidores se deixarem levar pelo optimismo, avaliações caras durante demasiado tempo podem realmente levar ao gradual desapego da realidade económica por trás de cada investimento.

Mas, por estranho que pareça, pelo menos nos mercados públicos, o sentimento da generalidade dos investidores não parece ser de euforia/ganância mas sim de receio/precaução. Enquanto a precaução for o sentimento de ordem, é difícil que se gerem os desequilíbrios insustentáveis que normalmente levam às tais bolhas.

Não quero com isto dizer que este é um momento particularmente oportuno para se investir, mas é útil relembrar que vivemos num ambiente em que o “caro” é o “novo normal”, e que é improvável que voltemos a ver níveis de avaliações do pré-2008 num futuro próximo.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.