Com a comissão parlamentar de inquérito (CPI) a apontar o fim dos seus trabalhos para meados de Junho, com as audições de Pedro Nuno Santos e Fernando Medina, começa a compor-se um cenário de calma para o Governo. Pois era ali, na CPI, que analisava a pornográfica indemnização de Alexandra Reis, que se encontrava o fulcro do seu Vietname. Cada audição era uma ferida aberta, uma vergastada na credibilidade de vários membros da equipa de António Costa.

Se os fogos derem tréguas durante o Verão e se o PRR tiver os seus milhares de milhões devidamente aplicados, teremos um novo cenário em que o Governo pode pensar mais descansadamente nas suas metas eleitorais. Curiosa por isso, a entrevista dada ao “Público” por Eurico Brilhante Dias. Ali está presente a verdadeira táctica que o PS irá seguir no que toca ao seu eleitorado fundamental.

Cito: “O Governo tem de dar um passo em frente nos salários da função pública”, ou “O país tem imensas lacunas na área da oferta de serviços às pessoas com mais idade que, com dignidade, precisam de ser apoiadas. Essa agenda precisa de ser construída para que o Estado chegue aos cidadãos, em particular aos mais vulneráveis”.

É, assim, totalmente claro que a função pública, os pensionistas e reformados, e os mais carenciados, consubstanciam o eleitorado essencial do PS, aquele que lhe deu uma maioria absoluta em Janeiro de 2022 e que não pode ser agora olvidado. E a folga orçamental que Fernando Medina tem, contribuirá muito para possíveis vitórias do PS.

Mas há um tema ainda distante que estará em cima da mesa dos socialistas. As presidenciais. Não esquecer que, nos últimos 20, anos foram dois homens oriundos da direita que se tornaram Presidentes da República, Aníbal Cavaco Silva e Marcelo Rebelo de Sousa. Agora, o PS quererá, naturalmente, ganhar essa batalha. O problema é que o nome mais forte, António Costa, não quer esse desígnio.

Assim sendo, terá de se procurar outro candidato da área da esquerda democrática. Se já sabemos da apetência de Augusto Santos Silva por esse cargo, e tem dado inúmeros exemplos desse apetite quase insaciável, mormente, quando se coloca como paladino da democracia contra o Chega. Depois, temos Ana Gomes. Só que não é do agrado do aparelho socialista por ser livre demais e quase uma outsider da política portuguesa.

Logo, essa pedra no sapato poderá ter como melhor solução alguém simpático aos portugueses, que não é político profissional, mas tem uma carreira que fala por si na área das Finanças, onde obteve excelentes resultados. E agora, ancorado na solidez de governador do Banco de Portugal.

Ao contrário de outros antecessores, que optaram quase pelo silêncio, Mário Centeno exponenciou presenças em eventos e nunca se reserva no momento de prestar declarações, e várias delas sem clemência para com o Governo. Não sabemos o que lhe apetece fazer no futuro, mas vai andar por aí e Belém pode entrar no seu horizonte. E será um bom candidato.

P.S.: Curioso o tempo da justiça. No dia em que começa a audição de Frederico Pinheiro, que antecede a de João Galamba, a Autoridade Tributária lança uma operação judicial sobre os principais clubes portugueses, nomeadamente no que toca a verbas que têm a ver com intermediação de negócios com passes de jogadores de futebol. Se há coisa que podia servir como spin destes problemas do Governo, nada melhor do que meter o desporto-rei ao barulho, que é aquilo que toca mais rapidamente nos portugueses. Para cortina de fumo não podia ser melhor. n

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.