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Cientistas lançam carta aberta de protesto sobre decisão do Tribunal de Justiça Europeu sobre genoma

Os cientistas europeus, incluindo 70 profissionais portugueses do setor, vão lançar uma carta aberta de protesto contra essa decisão, defendendo que as técnicas de melhoramento genético de alta precisão são fundamentais para a segurança alimentar e para o desenvolvimento científico e económico de Portugal e da Europa.
25 Julho 2019, 07h30

A comunidade científica europeia une-se hoje, dia 25 de julho, contra a decisão de há um ano do Tribunal de Justiça da UE – União Europeia de equiparar a edição precisa de genomas aos OGM – Organismos Geneticamente Modificados.

Os cientistas europeus, incluindo 70 profissionais portugueses do setor, vão lançar uma carta aberta de protesto contra essa decisão, defendendo que as técnicas de melhoramento genético de alta precisão são fundamentais para a segurança alimentar e para o desenvolvimento científico e económico de Portugal e da Europa.

“Há um ano, no dia 25 de julho de 2018, o Tribunal de Justiça da União Europeia comprometeu o desenvolvimento de uma nova e promissora ferramenta para melhoramento de plantas: a edição do genoma. As plantas obtidas por este meio de melhoramento de precisão foram equiparadas na Europa a organismos geneticamente modificados (OGM) e, assim, sujeitas à restritiva legislação que regula os OGM,
com grande prejuízo para a ciência, a agricultura e a sociedade”, defende um comunicado subscrito em Portugal pelo ITB – Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier da Universidade Nova de Lisboa, Instituto Gulbenkian de Ciência, INIAV – Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária e Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto.

Segundo o referido comunicado, “esta carta aberta defende que técnicas de melhoramento genético de alta precisão são fundamentais para a segurança alimentar e para o desenvolvimento científico e económico de Portugal e da Europa”.

“Há 10.000 anos, quando as primeiras tribos passaram de caçadores-coletores para a agricultura, iniciou-se um longo caminho de melhoramento das plantas. No início do séc. XX, com o conhecimento da genética de plantas, passaram a ser efetuados cruzamentos controlados e outras técnicas de melhoramento para obter descendências mais produtivas. O melhoramento genético das plantas tem prosseguido com ferramentas cada vez mais precisas, para possibilitar obter maior produção e qualidade e assim fazer face aos desafios da população em crescimento e a um clima em mudança. Os resultados estão todos os dias à nossa mesa”, defende o comunicado em questão.

O mesmo documento acrescenta que “o melhoramento de precisão por edição de genoma permite realizar pequenas alterações muito precisas no ADN, preservando os genes bons que a planta acumulou ao longo de centenas de gerações”.

“Esta nova ferramenta permite acelerar a obtenção de variedades de plantas mais resistentes às pragas e doenças, reduzir o uso de agrotóxicos e a quantidade de água de rega e até remover produtos potencialmente alergénicos como o glúten. Essas mesmas modificações podem ser obtidas de forma muito mais lenta através das técnicas tradicionais de melhoramento de plantas ou ocorrer espontaneamente na natureza”, destaca o comunicado.

A comunidade científica nacional que subscreve este documento destaca que, “de facto, e ao contrário do que acontece com os OGM, que incorporam fragmentos de ADN, não existe nenhum teste que permita distinguir os organismos sujeitos a edição do genoma daqueles em que ocorreram modificações naturais espontâneas”.

“Dada a sua precisão, essas variedades são tão seguras ou mais que aquelas obtidas a partir de técnicas convencionais de melhoramento. Ao pretender diferenciar o indiferenciável e equiparar as técnicas de melhoramento genético de precisão
aos OGM, o Tribunal Europeu tornou o processo de licenciamento desses organismos muito mais dispendioso, comprometendo os investimentos em ciência no setor europeu do melhoramento das culturas”, crita o referido comunicado.

O mesmo documento assinala que “a utilização destas técnicas no continente está a tornar-se o privilégio de um grupo restrito de grandes multinacionais, com capacidade financeira para dele tirarem partido em grandes culturas altamente rentáveis”.

“O resultado será que o desenvolvimento de variedades vantajosas de uma forma mais
rápida e direcionada ficará paralisado na Europa enquanto o resto do mundo adota a tecnologia. Acresce que esses produtos continuarão a entrar no mercado europeu, uma vez que os controlos alimentares não serão capazes de os diferenciar daqueles obtidos por melhoramento genético tradicional. A diferença na abordagem regulatória é mais do que uma questão de aposta na ciência. É também uma questão de segurança alimentar”, reclama a comunidade científica signatária desta carta aberta.

A comunidade científica europeia apela por isso às instituições europeias, incluindo o Conselho Europeu, o novo Parlamento Europeu e a próxima Comissão Europeia,
“para que adotem medidas legais que permitam aos cientistas e às entidades que desenvolvem novas variedades de plantas aplicar a edição de genoma para uma agricultura e produção alimentar ambientalmente e economicamente sustentáveis”.

“A capacidade de utilizar a edição de genoma é crucial para o bem-estar e a segurança alimentar dos cidadãos e para a adoção de técnicas agronómicas de menor impacto no meio ambiente”, conclui o referido comunicado.

Esta carta aberta da comunidade científica europeia foi subscrita por mais de 120 instituições do continente e mais de 70 investigadores em Portugal.

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