O sector sem fins lucrativos é, antes de mais, um produto da ação voluntária dos cidadãos. Mas uma parte desse sector – as IPSS, é em Portugal, também um produto das políticas públicas. Os efeitos destas no setor sem fins lucrativos escapam normalmente à sociedade, porque não há, muitas vezes, transparência sobre os resultados e os impactos das mesmas.

Não há, para começar, uma avaliação séria e continuada sobre os efeitos dessas políticas públicas. A questão da falta de transparência não será, objetivamente, do foro da má intenção. Mas é resultado de uma falta de clareza quanto aos focos prioritários da política pública. E de uma relação pouco saudável entre o Estado que financia, e não se avalia, e as instituições que dele são dependentes para sobreviver.

Uma relação em que as instituições, porque são privadas e independentes, deveriam poder ser publicamente francas, repetidamente e até à exaustão, para que a sociedade percebesse que vivem cronicamente subvencionadas. E que por isso nem sempre prestam os serviços com os níveis de qualidade que se esperaria. Muitas fazem o que podem e mais do que o que podem. E a sociedade portuguesa precisa de perceber isso.

Claro que do lado das instituições haverá ainda muita capacitação a fazer, ao nível da gestão, por exemplo. E as instituições têm ainda que percorrer algum caminho para perceber que há já um grande hiato entre as que entendem e atuam sobre isso e as que ainda não o fazem. Mas as instituições têm muitas competências técnicas, e conhecem o terreno como nenhuma alternativa, sobretudo pública. Hoje olhemos, contudo, para onde tudo começa: um modelo de financiamento público que não está a ter os resultados desejados, e todo um sistema que deveria ser seriamente avaliado e redesenhado. E nós, sociedade, não podemos olhar para o lado e achar que não é nada connosco.

Pensemos nos lares. Todos vimos o estado em que muitos idosos portugueses vivem nos lares pelo país fora. A pandemia tornou essa realidade visível. E as instituições clamaram por ajuda. Para um estudo da Universidade Católica no Porto (ATES) com a CNIS, de março deste ano, sobre O Impacto da pandemia nas IPSS e seus utentes em Portugal, 75,4% das IPSS reportaram como a principal necessidade o reforço do financiamento e 49,2% o reforço do pessoal operacional.

As instituições sociais que detêm os lares são cronicamente subvencionadas. O que o Estado paga para que, em vez dele, as instituições prestem os serviços, não é suficiente. A Segurança Social que os financia, também os inspeciona, fazendo de conta que não compreende a limitação dos apoios que dá. Apoios que limitam em muitos o número de colaboradores que podem ter, que ainda assim, são pagos a valores inferiores aos do sector público para funções iguais.

E hoje? Estão os lares melhor? Que cuidados estão os idosos a ter? De saúde, sociais? Que estão as instituições a fazer para que os idosos não se sintam sós? Estarão os idosos a ser tratados com dignidade? Se não, porque não?