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Comunidade internacional deve manter Brasil sob pressão sobre ambiente e redução da violência

Maria Laura Canineu recordou que “o Brasil tem um Congresso bastante alinhado com o agronegócio”, que deu “algumas sinalizações muito negativas”, evidenciando que este Governo “vai enfrentar um desafio grande”.
  • 8 – Brasil
7 Junho 2023, 10h19

A responsável da Human Right Watch (HRW) no Brasil defendeu hoje que a comunidade internacional deve “manter a pressão” sobre o Governo brasileiro para a defesa da Amazónia, dos povos indígenas e redução da violência e “pedir mais resultados”.

Em entrevista à Lusa em Lisboa, Maria Laura Canineu disse ver “sinais positivos” de que o novo Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, quer cumprir as promessas de campanha, quanto à defesa da Amazónia e dos direitos dos povos indígenas, ou mesmo contra a violência e a favor dos direitos humanos, mas também já há “sinalizações negativas”.

Por isso, defendeu que a comunidade internacional e o próprio povo brasileiro devem “manter a pressão” sobre a liderança de Lula da Silva e os parceiros internacionais do Brasil “têm de pedir mais resultados”.

A representante da organização internacional considerou que ainda “é bastante cedo para avaliar (…) as promessas que o Lula fez em relação ao meio ambiente e aos direitos humanos”, destacando “medidas muito importantes” já adotadas, como a nomeação da ativista Marina Silva para o Ministério do Ambiente, e Sónia Guajajara como a primeira ministra dos Povos Indígenas.

Lula também recuperou as multas por crimes ambientais, suspensas pelo seu antecessor, Jair Bolsonaro, que mais que triplicaram nos últimos dois meses, comparativamente aos mesmos meses dos quatro últimos anos do mandato anterior. Em relação à desflorestação, abril foi o primeiro mês em que se registou uma queda (-68%), mas nos meses anteriores, tinha continuado a aumentar.

Maria Laura Canineu recordou que “o Brasil tem um Congresso bastante alinhado com o agronegócio”, que deu “algumas sinalizações muito negativas”, evidenciando que este Governo “vai enfrentar um desafio grande”.

Na prática, explicou: “O que a gente não quer é que o Lula comece a negociar as promessas que ele fez no ambiente”, referindo-se à aprovação, na semana passada, do chamado “marco temporal” na Câmara dos Deputados, que prevê que os povos indígenas e tradicionais do país teriam apenas direito às terras que ocuparam até 05 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição em vigor.

“Já é uma sinalização negativa e o Lula foi criticado por ter negociado essas atribuições”, sustentou, insistindo que o Presidente deve revogar esta tese jurídica e mostrar ao Supremo Tribunal Federal – que julga hoje o “marco temporal” – e o Congresso que “este Governo vai proteger os povos indígenas, reconhecendo o seu direito aos territórios que tradicionalmente eles ocupam”.

Laura Canineu defendeu que o Presidente do Brasil “precisa enfrentar, cumprindo as promessas da campanha, porque muitas pessoas, inclusive movimentos indígenas, movimentos sociais votaram nessa frente ampla e democrática pelas promessas que ele fez em relação ao meio ambiente e aos direitos humanos”.

“Eu espero muito que ele não frustre essas pessoas, esses grupos”, sublinhou.

Lembrando que a Human Right Watch tem comentado, que a destruição ambiental “anda lado a lado com a violência contra povos indígenas e contra defensores da floresta e ambientais”, Laura Canineu disse que Lula e o seu Governo precisam de demonstrar também “compromisso em reduzir a violência”.

“Obviamente que esse governo foi eleito numa ampla rede que tem interesses também em mineração, que tem interesses que não convergem com o direito dos povos indígenas à demarcação e à aposta nos seus territórios tradicionais”, realçou.

Ainda em relação à desflorestação, Laura Canineu realçou que é preciso “prestar atenção” se será uma redução “consistente, sólida e se [Lula da Silva] vai manter e fortalecer essas medidas”.

Os anos “terríveis, antiambientais do Bolsonaro criaram uma opinião pública muito forte a favor da Amazónia e uma opinião pública internacional muito presente e necessária no sentido de proteger aquele que é um património do Brasil, mas também do mundo e que é super importante para a mitigação das crises climáticas”, realçou.

Então, na sua opinião, o que a comunidade internacional e o público brasileiro devem fazer “é continuar a pressão”.

“O que a gente pede é que a comunidade internacional permaneça vigilante e ativamente pressione o Governo para que essas medidas continuem, de redução do desmatamento, mas também de combate à violência, e a União Europeia tem alguns meios para fazer isso”, comentou.

A defensora dos direitos humanos lembrou que outra das medidas positivas do governo Lula nestes primeiros meses foi ter restituído o Fundo Amazónia – financiado pela Noruega, Alemanha e EUA -, com recursos “bem importantes” para apoiar a redução da desflorestação, assim como iniciativas e parcerias com organizações que conhecem o que está a acontecer aos povos indígenas para fiscalizar e vigiar os seus territórios.

É também necessário “o combate à impunidade”, defendeu.

Lembrando que esta semana fez um ano que foram assassinados defensores da Amazónia – o jornalista Dom Phillips e o ativista Bruno Pereira -, a responsável HRW salientou que “este caso, como teve muita visibilidade internacional”, está a avançar.

Mas “essa não é a regra”, frisou. Em geral, “atos de violência, assassinato de defensores e de pessoas que lutam pela terra na Amazónia e no Brasil, não são levados à justiça. A impunidade é a regra (…) e existem falhas e omissões muito sérias na investigação desses crimes. As instituições e autoridades não fazem o que tem de ser feito para apurar as responsabilidades”, acrescentou.

“Nos últimos 10 anos, 300 pessoas foram mortas em razão de conflitos por uso da terra e de recursos naturais. Muito pouco dessas mortes foram de facto apuradas e investigadas. Só no ano de 2022 foram 34 pessoas mortas na Amazónia, nove indígenas”, concluiu.

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