Na sua última publicação o Investigate Europe denuncia como um conjunto de benefícios fiscais, concebidos por países da União Europeia para atrair investimentos estrangeiros, acaba por canalizar esses capitais para o sector imobiliário, desviando-os de outras atividades onde poderiam ser mais produtivos. Dá-se assim sobreinvestimento num sector que é frequentemente improdutivo e cuja produção é não transacionável, o que contribui para agravar o défice externo. No caso português, estima-se que o desvio de capitais para investimento imobiliário atinja um valor anual superior a dois mil milhões de euros.

É neste contexto que grandes Fundos de Investimento adquirem imobiliário de uma forma não muito transparente – sendo muito difícil rastrear quem são os responsáveis por estes negócios – enquanto contribuem para inflacionar as rendas e os preços dos imóveis. As últimas previsões do Eurostat apontavam para uma subida dos preços das casas de 70% em Portugal nos últimos 12 anos, contra uma subida de 45% para o conjunto da União Europeia.

O que preocupa o Investigate Europe é como estes fundos estendem o negócio imobiliário a vários países europeus – Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, França, Grécia, Hungria, Itália, Noruega, Portugal, Reino Unido e Suécia – num ambiente de absoluta legalidade, proporcionado pela benevolência dos sistemas fiscais europeus.

Em consequência, habitar está a transformar-se num bem de luxo a que nem todos conseguem aceder. No caso português, o problema não se circunscreve às cidades, sendo os concelhos do interior aqueles onde se registaram as maiores subidas recentes dos preços das casas (INE).

As conclusões do Investigate Europe apontam para a urgência de alterar os sistemas fiscais com o objetivo de corrigir os enviesamentos negativos que estão a causar.

Só que não basta reverter os benefícios fiscais para solucionar o problema. No seu jogo concorrencial para atrair capitais estrangeiros, os países europeus condenaram-se a replicar os comportamentos uns dos outros. Numa tragédia dos comuns, onde a combinação de soluções individuais culminou num conjunto de más escolhas para todos, os sistemas fiscais nivelaram-se por baixo, prejudicando a produtividade e encarecendo o nível de vida.

Assim, se é imprescindível aumentar os impostos sobre estes investimentos altamente destorcedores para conseguir controlar a inflação do preço das casas e diminuir o custo da habitação nos cabazes das famílias, também é verdade que nenhum país terá capacidade para captar capitais estrangeiros e direcioná-los para os seus setores mais produtivos e/ou de bens transacionáveis enquanto os parceiros europeus mantiverem os seus respetivos incentivos fiscais.

O problema da concorrência fiscal no sector imobiliário terá de fazer parte da agenda europeia, à semelhança do que aconteceu com os lucros das multinacionais para os quais a Comissão Europeia propôs uma taxa de imposto mínima de 15% para empresas em que a sociedade-mãe ou uma filial esteja sediada na União europeia e que apresentem um volume de negócios superior a 750 milhões de euros.

A análise do Investigate Europe identifica e bem a frente a trabalhar para tornar as economias europeias mais equilibradas e justas do ponto de vista social – eliminar os benefícios fiscais para o sector imobiliário – só precisa de sublinhar quão imprescindível é que esta frente seja trabalhada em conjunto.