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Corrupção e a Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024

A corrupção é de difícil mensuração, pois não pode ser medida através de indicadores econométricos objetivos. É sempre possível avaliar a situação, mas não é possível quantificar o problema em toda a sua extensão.
13 Julho 2021, 07h15

A corrupção é um fenómeno complexo, que assume diversas dimensões, desde económica, social, política e até cultural.

Não existe consenso em torno do conceito de corrupção. No entanto, é consensual que numa conduta corruptiva se verifica o abuso de um poder ou função pública de forma a beneficiar-se ou a um terceiro, contra a promessa do pagamento de uma quantia ou outro tipo de vantagem indevida. No fundo, é um abuso de poder, cargo ou relação com a administração pública em benefício próprio ou de terceiro.

A corrupção é de difícil mensuração, pois não pode ser medida através de indicadores econométricos objetivos. É sempre possível avaliar a situação, mas não é possível quantificar o problema em toda a sua extensão.

Ciente de que o fenómeno da corrupção destrói a confiança dos cidadãos nas instituições públicas (Estado, autárquicas, etc) ou privadas (grandes grupos económicos) envolvidas, gera desconfiança e insegurança, que fragiliza a economia pelo aumento dos custos de contexto, debilita as finanças do Estado, provoca a erosão dos alicerces do Estado social e acentua as desigualdades sociais e económicas, o nosso XXII Governo constitucional consagrou como prioridade o combate à corrupção e à fraude. A corrupção cria no cidadão um sentimento de impunibilidade e desincentiva o mesmo ao cumprimento de regras, nomeadamente ao níveis de regras fiscais e pagamento de impostos.

São necessárias as medidas destinadas a reduzir a corrupção, os conflitos de interesses e o favoritismo mas as mesmas têm que ser articuladas com profundas mudanças estruturais e culturais nos organismos públicos e na sociedade em geral

A nível europeu, o artigo 83.º, n.º 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia identifica a corrupção como um dos crimes em relação aos quais devem ser adotadas diretivas prevendo normas mínimas em matéria de definição de infrações penais e de sanções a aplicar, visto que a corrupção tem muitas vezes implicações que ultrapassam as fronteiras internas da UE.

A Comissão Europeia criou um novo mecanismo, chamado Mecanismo de Elaboração de Relatórios Anticorrupção da UE, para controlar e avaliar os esforços envidados pelos Estados‑Membros em matéria de luta contra a corrupção, e, dessa forma, gerar um maior empenhamento político neste combate. Assim, a partir de 2013, com apoio de um grupo de peritos e de uma rede de correspondentes de investigação, são elaborados relatórios da EU anticorrupção, tendo o primeiro sido elaborado a 03.02.2014.

Portugal é parte da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, adotadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 31 de Outubro de 2003, aprovada pela Resolução da Assembleia da República nº 47/2007, em 19 de Julho de 2007, a qual foi ratificada pelo Decreto do Presidente da República nº 97/2007 de 21 de Setembro.

A convenção é composta por 71 artigos, divididos em 8 capítulos. Os mais importantes estão reunidos em quatro capítulos e tratam dos seguintes temas: prevenção, penalização, recuperação de ativos e cooperação internacional. São esses capítulos que requerem adaptações legislativas e/ou ações concomitantes à aplicação da convenção a cada país. Tal como definido no artigo 1º da Convecção, a sua finalidade é promover e fortalecer as medidas para prevenir e combater mais eficaz e eficientemente a corrupção; promover, facilitar e apoiar a cooperação internacional e a assistência técnica na prevenção e na luta contra a corrupção, incluída a recuperação de ativos; promover a integridade, a obrigação de render contas e a devida gestão dos assuntos e dos bens públicos.

Ao nível da legislação nacional, o nosso Código Penal prevê vários crimes relacionados com a corrupção, que vão desde a prevaricação (art.ºs 369º e 370º) a recebimento indevido de vantagem (artº 372º) e os crimes de corrupção ativa (artº 372º) e passiva (artº 373º), conforme o agente esteja, respetivamente, a oferecer/prometer ou a solicitar/aceitar uma vantagem patrimonial ou não patrimonial indevida, distinguindo-se ainda, cada uma, conforme o ato solicitado ou a praticar seja ou não contrário aos deveres do cargo do funcionário corrompido.

Vigora também a lei n.º 20/2008, de 21 de abril, que estabelece a responsabilidade penal por crimes de corrupção no comércio internacional e na atividade privada (tráfico de influências, branqueamento de capitais). Existem ainda inúmeros diplomas com normas dispensas sobre corrupção.

Através da Resolução do Conselho de Ministros nº 37/2021 de 06 de abril de 2021, foi aprovada a Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024.

A luta contra o fenómeno da corrupção não pode ser limitada a um único conjunto de medidas.

O sucesso desta luta passa por criar instrumentos de prevenção, detectação, repressão e sancionamento, os quais em conjunto irão promover uma consciência cívica de que este fenómeno é nefasto para a sociedade e contribui drasticamente para a criação de assimetrias sociais.

Conforme se pode ler do preambulo da Estratégia para a Corrupção 2020-2024 “0 combate à corrupção é essencial ao reforço da qualidade da democracia e à plena realização do Estado de Direito, assegurando uma efetiva igualdade de oportunidades, promovendo maior justiça social, favorecendo o crescimento económico, robustecendo as finanças públicas e aumentando o nível de confiança dos cidadãos nas instituições democráticas”.

Na estratégia definida o governo considerou como prioritária a dimensão preventiva, criando um conjunto de ações, articuladas e integradas, tendentes a permitir ao Estado agir através da formação dos cidadãos, contribuindo para que os mesmos conheçam os seus direitos e deveres, criando transparência na atuação e ação pública, melhoramento da capacidade de resposta da Administração por forma a diminuir contextos geradores de práticas corruptivas (tipo aceleramentos de processos ou o vulgo “jeitinho”), criar forma de identificação dos riscos de corrupção ou fraude, reduzindo a necessidade de repressão ou de ação penal.

A Estratégia para a Corrupção 2020-2024 prossegue os seguintes objetivos: promoção da transparência e da integridade como valores comuns, integrantes de uma cultura partilhada por todos os cidadãos; fortalecimento das instituições públicas e da confiança que os cidadãos nelas devem depositar; fomento e a garantia de existência de igualdade de tratamento e de oportunidades para todos os cidadãos; melhoria da saúde das finanças públicas, do ambiente de negócios e do desempenho da economia; reforço da segurança interna quanto a ameaças externas.

As prioridades definidas são: melhorar o conhecimento, a formação e as práticas institucionais em matéria de transparência e integridade (através de campanhas de sensibilização, formar para a cidadania, para a integridade, reduzir burocracia, reforçar transparência e eficiência, facilitar acesso à comunicação); prevenir e detetar os riscos de corrupção na ação pública (através da criação de programas de public compliance e de códigos de conduta, canais de denúncia, regime geral de prevenção da corrupção, reforço da eficácia da atuação do Tribunal de Contas); comprometer o setor privado na prevenção, deteção e repressão da corrupção; reforçar a articulação entre instituições públicas e privadas; garantir uma aplicação mais eficaz e uniforme dos mecanismos legais em matéria de repressão da corrupção, melhorar os tempos de resposta do sistema judicial e assegurar a adequação e efetividade da punição; produzir e divulgar periodicamente informação fiável sobre o fenómeno da corrupção, cooperação no plano internacional no combate à corrupção.

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