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Critérios ESG ganham importância e obrigam empresas a adaptarem-se

Preocupações com a sustentabilidade têm ganho importância e tem obrigado os agentes económicos a adaptarem-se, para responderem às regras e poderem ser mais competitivos no seu mercado e na procura de financiamento.
23 Junho 2022, 23h01

Os investimentos com critérios ambientais, sociais e de governança corporativa (ESG, na sigla em inglês) têm uma cada vez maior importância na operação das empresas, especialmente depois do reconhecimento de uma situação de emergência climática e da crise pandémica, com a pressão da opinião pública e as determinações dos decisores políticos a incentivarem a mudança. A acomodação do mercado às diretivas passa, também, pelo envolvimento do sector financeiro, que subordina o financiamento ao cumprimento de critérios de sustentabilidade. Em conjunto, a atuação destas diferentes forças tem um reflexo direto na forma como as organizações desenvolvem a sua atividade, obrigadas a procurarem soluções mais sustentáveis.

“Se pensarmos que as instituições financeiras têm um papel importante na alocação e pricing de financiamento a projetos de investimento, a introdução de critérios ESG neste processo contribuirá certamente para as empresas ‘sentirem’ diretamente o impacto de uma eventual menor preocupação com temas de sustentabilidade”, diz ao Jornal Económico (JE) João Sousa, partner de Tax Services da consultora EY. “Felizmente, em Portugal, temos já casos de grupos de matriz portuguesa que emitiram dívida com remuneração calculada, entre outros, com recurso a indicadores de sustentabilidade”.

Em Portugal, o mercado de emissão da chamada “dívida verde” – investimento que só pode ser aplicado em projetos sustentáveis, de acordo com determinadas regras – deu os primeiros passos em 2018 e é dominado, naturalmente, pelas empresas do sector da energia, que promoveram investimento em produção renovável. Destaca-se a EDP, que definiu no seu plano estratégico o objetivo de chegar a 50% de financiamento sustentável até 2025, mas outras empresas enveredaram já pelo mesmo caminho, como, este ano, a Caixa Geral de Depósitos.

“Estes bons exemplos servirão, estamos seguros, para mostrar qual o caminho que deve ser seguido no futuro pelas empresas, sob pena de, no limite, estar em causa a própria viabilidade económica”, diz João Sousa.

A nível internacional, nos Estados Unidos, o maior mercado, no ano passado, os fundos ESG captaram cerca de 51 mil milhões de dólares (cerca de 43,2 mil milhões de euros) de investimento, naquele que foi o quinto ano consecutivo de máximos; face a 2019, os valores mais do que duplicaram. A nível global, segundo a Morningstar, os ativos sob gestão de fundos ESG aumentaram 29% no último trimestre de 2021, para 1,7 biliões de dólares (cerca de 1,4 biliões de euros) e a Bloomberg Intelligence estima que possam chegar aos 53 biliões de dólares (cerca de 44,7 biliões de euros) já em 2025, representando um terço de todos os ativos sob gestão de fundos.

Para os especialistas, este é já um caminho sem retorno e as empresas têm de procurar adaptar-se às novas regras em vigor e à perspetiva de alteração do enquadramento em que operam, que será feita sempre na mesma direção.

“Uma primeira barreira a ultrapassar é o reforço da consciencialização da importância dos temas ESG no mindset e cultura empresariais”, refere ao JE Júlio Almeida, senior manager de Tax Services da EY. “Um segundo desafio será reforçar as competências dos recursos internos para terem as qualificações e o grau de preparação que as novas exigências de reporte implicam”, acrescenta.

No último relatório de supervisão da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários sobre fatores de sustentabilidade nos emitentes cotados, o regulador refere que “a adoção das melhores práticas e a adesão às mais exigentes recomendações, associadas a modelos de monitorização e supervisão robustos, em linha com as diferentes realidades dos emitentes e numa lógica proporcional, contribuem decisivamente para empresas, independentemente da sua dimensão, mais orientadas e capacitadas para uma presença efetiva em mercado”.

O Estado no incentivo à sustentabilidade
O Estado tem também um papel a desempenhar neste processo, em que a fiscalidade pode ser usada como uma ferramenta modeladora de comportamentos, tanto para empresas como para particulares.

“Os impostos são um instrumento fundamental que os Estado têm de condicionar ou induzir comportamentos e influenciar o processo de tomada de decisão dos agentes económicos” aponta Júlio Almeida. “Na atual conjuntura, cabe igualmente referir o contributo das instituições comunitárias para acelerar as mudanças necessárias” para que sejam cumpridos os objetivos estabelecidos para 2030 e para 2050, especialmente no que respeita à descarbonização, e o alinhamento com os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável definidos pela Organização das Nações Unidas.

“Existem, ainda, inúmeras áreas onde o sistema fiscal português pode ser aperfeiçoado por forma a facilitar e promover a implementação de soluções sustentáveis por parte das empresas”, considera, no entanto, Almeida. Depois de um período atípico, em que a proposta inicial de Orçamento do Estado para 2022 foi chumbada na Assembleia da República, levando a uma crise política que resultou na antecipação das eleições legislativas, ganhas pelo PS com maioria absoluta, espera-se que a proposta de OE2023, já elaborado, na sua totalidade, pelo novo Governo, seja apresentado a 10 de outubro, como prevê a lei. “Seria salutar que o próximo Orçamento do Estado trouxesse novidades a este respeito”, acrescenta.

No entanto, apesar da pressão para o desenvolvimento de políticas e operações mais sustentáveis, o mercado está, ainda, em processo de formação, os agentes económicos debatem-se, ainda, como a definição de regras e de métricas para a sustentabilidade, que sejam comumente aceites e que permitam a comparibilidade.

“Peter Drucker terá afirmado ‘If you can’t measure it, you can’t manage it [se não o consegues medir, não o consegues gerir’. Esta frase aplica-se igualmente ao tema da sustentabilidade”, afirma João Sousa. “Com efeito, sem a definição e adoção – voluntária ou imposta por regulamentação governamental – de métricas comuns por parte das empresas, continuaremos a ter situações de assimetrias na informação disponível aos stakeholders – consumidores, decisores de atribuições de subsídios públicos, agentes económicos – que apenas beneficiam os infratores em detrimento da sociedade em geral”, considera.

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