O poeta-ministro da Economia, o mesmo que desenhou o plano de recuperação e resiliência português em dois dias e concentrou o investimento no Estado (não criador de riqueza), na sua primeira intervenção no Parlamento, disse que iria “falar” com as empresas e ponderava tributar os lucros aleatórios e inesperados.

Não sendo fiscalista atrevo-me a dizer que tal tributação já existe, através do IRC e em especial da derrama, que introduz essa tributação progressiva em função do aumento dos lucros. E sobre a qualificação de tais lucros como aleatórios e inesperados parece-me que o senhor ministro ou estava a pensar no jogo, actividade puramente aleatória, de possibilidade de ganhar ou perder (álea), ou perdeu uma belíssima ocasião para se calar.

Por natureza, os lucros são aleatórios. Quem constitui e opera uma empresa bem sabe que tal actividade pode gerar lucros ou prejuízos. É a contrapartida do risco, a álea própria do mundo dos negócios e das empresas…

Podemos pensar agora no carácter da previsibilidade dos lucros. Todos quantos gerem empresas sabem que os mesmos podem ser previstos, num plano de negócios, mas se vão acontecer ou não depende de múltiplos factores, alguns deles fora do controlo dos empresários e gestores: subida do preço das matérias-primas, perda de clientes para concorrentes, esmagamento das margens pelos clientes com forte pressão negocial, aumento dos preços pelos fornecedores, preterição num concurso público ou privado, aumento inusitado da energia, etc..

Por definição, os lucros são aleatórios (possibilidade de perda ou de ganho) e inesperados ou, em certa medida, não totalmente controlados ou controláveis. E já são tributados. E, através da derrama, quanto mais lucros se apurarem, mais são tributados.

O que eu gostava de ouvir era o ministro-poeta “falar” com as empresas sobre os prejuízos aleatórios e inesperados e a sua dedução integral (e sem caps ou limites máximos a essa dedução ou prazos para a sua dedução…) à matéria colectável, seja do reporte de prejuízos passados, seja de retroagir os prejuízos apurados num determinado exercício económico aos exercícios anteriores onde se pagou IRC sobre lucros.

Quando este Governo fala de impostos extraordinários, temporários, conjunturais, para fazer face a uma crise ou aos efeitos de uma guerra, tenham muito cuidado, porque normalmente esses impostos ficam para todo o sempre. Para dar um exemplo, a célebre contribuição sobre o sector energético. Porventura, com este aleatório e inesperado aumento da energia, talvez acabar com a CESE, que induz um aumento do preço ao consumidor do gás, electricidade e combustíveis, fosse aconselhável. É que o aumento aleatório e inesperado do aumento do custo da energia tal imporia, num Estado justo…

Não quero com isto dizer que quando existem verdadeiras windfalls não se possa tributar essa mais-valia, que não se deve ao esforço do empresário ou do proprietário. Foi o caso das contribuições extraordinárias sobre mais-valias imobiliárias decorrentes de valorizações de imóveis situados em zonas onde o Estado concebeu e construiu importantes infra-estruturas, por exemplo nas áreas beneficiadas pela construção da Ponte Vasco da Gama.

Já importar esse conceito de windfall tax para o lucro das empresas, ou de algumas empresas, que supostamente beneficiam dos efeitos económicos da guerra, empresas do sector petrolífero e do sector da distribuição, é de uma gritante injustiça. Elas já serão tributadas pela via do IRC e da derrama, elas sofrem do aumento do custo dos seus inputs e têm a margem decorrente da pressão concorrencial do mercado onde actuam.

Este é o momento de reduzir impostos e não o de os aumentar, pois já se verifica o mais perverso e escondido dos impostos, a inflação. Claro que o peso do Estado, de que tanto gosta este poeta-ministro, terá de diminuir!

Como dizia Thatcher, não há dinheiro do Estado, mas apenas dinheiros dos contribuintes!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.