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CTT: De estrela brilhante a correio de risco e um destino incerto

Em quatro anos, as ações dos CTT viveram dois ciclos claros: subida rápida e queda vertiginosa. Depois da descida dos lucros, o corte nos dividendos e o plano de restruturação, a desvalorização estancou e o título está a recuperar. Será este um novo ponto de viragem?
  • Rafael Marchante/Reuters
7 Janeiro 2018, 16h50

Coincidências, ironias do destino, simetrias nos ciclos de altos e baixos. Como em tudo, estes fenómenos ocorrem nos mercados acionistas. No turbilhão de notícias que conduziram o percurso das ações dos CTT nos últimos anos houve uma dessas ocorrências.

Entre a maior valorização diária, de 7,88%, e o maior tombo, de 21,68%, passaram precisamente três anos, entre novembro de 2014 e o mês homólogo de 2017. Os eventos que estiveram na base das duas flutuações mais expressivas na história do operador postal em bolsa eram os mesmo no calendário anual: a apresentação dos resultados dos primeiros nove meses do ano.

Pelo meio, uma história de subida rápida e descida vertiginosa. No prólogo da história está uma entrada em bolsa em dezembro de 2013, que não animou imediatamente os investidores, mas as ações ganharam fôlego em 2014, ano em que uma segunda fase da privatização foi considerada “um grande êxito” pelo então ministro da Economia, António Pires de Lima.

No exercício desse ano, um brilharete: as receitas subiram e os gastos desceram, permitindo um disparo de quase 27% no lucro. A rentabilidade permitiu à empresa pagar um dividendo por ação de 0,465 euros, quase a totalidade do resultado líquido de 0,51 euros por ação. Os CTT ganhavam a reputação de ser uma cotada que remunerava bem os acionistas.

Antes da divulgação dos resultados dos primeiros nove meses de 2015 (nova coincidência), o título tocou no máximo de sempre: 10,49 euros por ação, já muito distante dos 5,52 euros da operação pública de venda de 2013.

Correio preocupante

Atrás do brilho havia, no entanto, fatores preocupantes e essa apresentação de resultados provou ser um momento de viragem. No dia seguinte, as ações afundaram 11%. Foram duas as causas: receios sobre os custos operacionais para lançar o BancoCTT e, principalmente, a incapacidade de a empresa estancar ou encontrar alternativas para a quebra no negócio de correio tradicional. Subidas nos preços permitiram ainda aumentar as receitas esse ano, mas o lucro dos 12 meses acabou por cair 6,6%.

Os dois anos seguintes vieram confirmar a tendência. As receitas caíam, os gastos operacionais aumentavam, a cotação mantinha-se em curva descendente, mas o dividendo continuava a aumentar.

O dia 1 de novembro de 2017 poderá ter sido a gota de água desse processo. Após o anuncio de um tombo de 57% nos lucros dos primeiros nove meses de 2017, as ações afundaram 21,68% num dia, contribuindo para o título registar o pior desempenho no PSI 20 no ano, com uma queda de mais de 45%, num ciclo em que o índice disparou 15%.

Novo ponto de viragem?

O anúncio dos resultados foi acompanhado por um corte de 20% no dividendo, para 0,38 euros, relativo ao exercício de 2018 e a promessa de um plano de restruturação. Os bancos de investimento apressaram-se a cortar as recomendações e os preços-alvo, levando a cotação para o nível mais baixo de sempre, nos 3,04 euros, a 27 de novembro.

O plano de restruturação foi apresentado a 19 de dezembro e poderá ser um novo ponto de viragem. A estratégia é ambiciosa, envolve o encerramento de lojas, cortes de mais de 800 postos de trabalho e reduções nos rendimentos dos gestores da empresa.

O Caixa Banco de Investimento explicou que “o plano é amplo em termos de cortes de custos e também inclui receitas através da venda de ativos non-core”, mas alertou que “será difícil de executar e vai enfrentar pressão política e contestação significativa dos sindicatos”, algo que não demorou a acontecer.

Os investidores, entretanto, parecem ter gostado do plano. As ações dispararam mais de 3% na sessão após o anúncio e nos últimos dias já registaram o melhor arranque de ano de sempre.

José Novo, trader da Orey iTrade explicou à Reuters que “o aliviar da despesa, a manutenção do dividendo nos 0,48 euros relativamente a 2017” acabou por agradar.

Francisco Lacerda salientou, também à agência de notícias, que o facto de os CTT terem uma estrutura financeira sólida, sem dívida bancária significativa, e um caixa significativa “é uma base sólida para apoiar a transformação profunda que, como em qualquer operador postal, tem de ocorrer”.

“Facilita [o plano] porque não estamos a falar de uma empresa endividada e com problemas por essa razão, estamos a falar de uma empresa que tem o negócio-base em profunda transformação e está a fazê-lo, mas em cima de uma estrutura financeira sólida”, acrescentou.

Explicou que a empresa tem de se ajustar à queda do correio tradicional. “A digitalização é uma realidade incontornável e, portanto, nas tarefas administrativas estão pessoas a ser substituídas por computadores e isso passa-se em todas as empresas”.

De momento, a queda da ações parece estar estancada, seja porque os investidores acreditam nas palavras e no plano de Lacerda, ou por estarem a aproveitar o preço de desconto ao qual o título chegou e à procura de mais-valias.
A cotação dos CTT fechou a sessão de quinta-feira nos 3,69 euros por ação, abaixo de todos os preços-alvo citados no site da empresa, que estão no intervalo de 3,75 euros a 5,50 euros.

Artigo publicado na edição digital do Jornal Económico. Assine aqui para ter acesso aos nossos conteúdos em primeira mão.

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