A recente divulgação pelo jornal POLITICO de um rascunho do Supremo Tribunal norte-americano que prevê a revogação do direito constitucional ao aborto gerou uma onda de manifestações nas principais cidades dos Estados Unidos. Também na Croácia, mas por outros motivos, o aborto levou milhares às ruas da capital, Zagreb. Em causa está uma mulher que lutou para poder abortar devido a doença do feto.
Sob o mote “Não toquem nos nossos corpos”, milhares de norte-americanos estão a manifestar-se para defender o direito ao aborto perante a possibilidade de o Supremo Tribunal o poder vir a anular. “Acabamos com os ataques ao aborto. Estamos a manifestar-nos hoje para dizer alto e bom som: não toquem nos nossos corpos”, é o lema da Women’s March, uma das organizações responsáveis por esta jornada de contestação, na rede social Twitter.
Por todo o país foram organizados mais de 450 desfiles, entre os quais grandes marchas em Washington, Nova Iorque, Chicago, Austin e Los Angeles.
In the words of our Executive Director @RachCarmona:
🗣️WE WON’T GO BACK.
And we’ll be ungovernable until this government starts working for US. #BansOffOurBodies pic.twitter.com/X4oCKafYsE
— Women's March (@womensmarch) May 14, 2022
Na capital, em Washington, o desfile arranca às 14h00 locais (18h00 em Lisboa) e segue em direção ao Supremo Tribunal, onde são esperados cerca de 17 mil manifestantes, estimam os organizadores.
As manifestações agendadas para todo o país foram convocadas após uma fuga de informação sobre uma iniciativa do Supremo Tribunal norte-americano para revogar o direito constitucional ao aborto, que teria impacto em todos os 50 estados norte-americanos. Se anulada, a decisão ‘Roe v. Wade’, que protege como constitucional o direito das mulheres ao aborto, os Estados Unidos voltarão à situação que existia antes de 1973, quando cada estado era livre de proibir ou autorizar a realização de abortos.
O anúncio da decisão do órgão supremo norte-americano está previsto para junho, meros meses antes das eleições intercalares de novembro, das quais sairá a nova composição do Congresso. A divisão gerada pela questão do aborto poderá ter efeitos na campanha eleitoral. Ainda esta quarta-feira, o Senado rejeitou uma lei que previa a consagração do direito ao aborto na legislação federal, naquela que é uma das mais recentes demonstrações da polarização existente.
Na Croácia, protestos dividem-se entre os dois lados da barricada
Pelo terceiro dia consecutivo, milhares de pessoas participaram hoje numa marcha contra o aborto em Zagreb, na Croácia, apenas dias depois de uma mobilização de apoio a uma mulher que lutou para poder abortar devido a doença do feto.
“Crianças não nascidas – a minoria mais ameaçada na Croácia” e “As vidas não nascidas também importam” eram algumas das mensagens escritas nos cartazes empunhados pelos manifestantes durante a “Marcha pela Vida”, organizada anualmente. “Apoiamos a vida, os valores morais, os valores dados por Deus”, disse, à Agence France-Presse (AFP), Maja Ivic, que se fazia acompanhar dos dois filhos.
Por seu lado, Sinisa Kubatovic, de 52 anos, disse que a vida humana, desde a conceção até à morte natural, deve ser protegida. “O aborto deve ser autorizado apenas se a gravidez ameaçar seriamente a vida da mulher”, entendeu.
#Croatia – An anti-abortion rally in central Zagreb drew crowds of several thousands as activists in the staunchly Catholic country warn of an erosion of women's reproductive rights #AFP
📸 Denis LOVROVIC pic.twitter.com/AME5iVgErw
— AFP Photo (@AFPphoto) May 14, 2022
Nos últimos dias, o caso de Mirela Cavajda, de 39 anos, abalou o país, visto que estava no sexto mês de gravidez quando os médicos diagnosticaram um tumor cerebral ao feto. O seu pedido de aborto foi recusado por quatro hospitais em Zagreb, mas após pressão pública uma comissão médica deu luz verde ao procedimento, que aconteceu na quarta-feira.
Na Croácia há grupos conservadores, apoiados pela Igreja Católica, que pedem ao governo que limite o direito ao aborto, autorizado até a décima semana de gravidez. Após esse período, o aborto pode ser realizado se a saúde da mulher ou do feto estiverem em perigo, em caso de violação ou de incesto.
O direito ao aborto está, cada vez mais, a ser posto à prova porque há muitos médicos que se recusam praticá-lo invocando a objeção de consciência. O Tribunal Constitucional da Croácia rejeitou, em 2017, um recurso de vários grupos conservadores a exigir a proibição do aborto.