O debate público sobre energia em Portugal resume-se hoje praticamente a falar de preços dos combustíveis e da electricidade, para (se quisermos ser caridosos) lamentar que estejam tão elevados, criticar a falta de medidas para o seu controlo e prever as nefastas consequências que terão para as empresas e famílias.

Eu teria gostado se a campanha eleitoral tivesse sido aproveitada para uma discussão aprofundada e séria sobre o presente e o futuro da produção e abastecimento de energia em Portugal. Mas o tema é difícil e árido, não se dá bem com a necessidade de produção de soundbites que visam converter reacções emocionais em votos e que são preferidos pelos estrategas de marketing político.

É por isso que se fala na alta dos preços dos combustíveis sem relacionar com uma análise da oferta e da procura nos mercados mundiais. Que se critica as decisões de fecho de refinarias ou centrais térmicas a carvão sem se procurar as razões macroeconómicas que verdadeiramente as justificam. Que não se completa a discussão da exploração das reservas de lítio com a descrição isenta das obrigações a que os concessionários estão obrigados em termos de segurança das populações e do ambiente. É porque é mais fácil.

Isto não é suficiente. Há muito mais para discutir. Mas há que aprofundar a informação para melhorar a qualidade da discussão, e contribuir para a construção de cenários que possam sustentar o desenvolvimento do país.

A energia é um factor determinante do desenvolvimento. Sem energia, não há produção industrial, nem distribuição, nem transportes e comunicações, nem comércio ou serviços, nem conforto doméstico, nem segurança na via pública. Quase tudo o que fazemos implica consumo de energia em maior ou menor escala. E o crescimento económico e a melhoria das condições de vida que são proporcionados pelo mais fácil acesso à energia são também fonte do aumento das solicitações para que mais energia seja disponibilizada.

Também é um facto que Portugal é dependente de fontes externas para a satisfação das suas necessidades energéticas. O petróleo e o gás são totalmente importados, assim como o era o carvão. Mesmo a água que alimenta as barragens vem parcialmente de Espanha. A geração de energia de fontes renováveis disponíveis em território nacional é, pelo menos por enquanto, insuficiente para a satisfação das necessidades de consumo, e a sua disponibilidade varia em função de condições requeridas para a produção, o que introduz uma enorme e dispendiosa complexidade ao funcionamento do sistema como um todo.

Esta discussão é necessária porque incide sobre o modelo de sociedade que somos ou queremos ser. Implica uma análise do paradigma de desenvolvimento económico que temos, que visa o aumento da produtividade pela via da redução do custo da produção. Eu prefiro olhar para o valor da produção. Deveríamos produzir bens de qualidade e com elevado valor acrescentado que concorressem nos mercados com os produzidos na Suécia ou na Alemanha, e não com os oriundos do Vietname ou do Bangladesh.

Temos de discutir como mudamos, num quadro evolutivo cada vez mais complexo e diverso que exige uma alteração fundamental não só de comportamento, do modo como fazemos as coisas, mas também (e sobretudo) de atitude, incluído a ultrapassagem de um certo conservadorismo e egocentrismo tão característico dos portugueses. Como produzir energia com menor dependência externa e aproveitando ao máximo os recursos endógenos (incluindo as reservas de lítio). Como garantir a sustentabilidade das empresas e das suas actividades com salvaguarda do ambiente e respeito pelos direitos das pessoas.

Como pode a energia contribuir para que as empresas produzam com maior valor acrescentado para que a riqueza gerada seja maximizada e possa ser distribuída com maior eficiência e equidade. E como fomentar o empreendedorismo, a inovação e a investigação.

Infelizmente, a campanha eleitoral que passou foi mais uma oportunidade perdida.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.