Foi Winston Churchill quem um dia afirmou que a democracia era o pior dos sistemas… com exceção de todos os outros. Hoje permito-me acrescentar que, além do pior dos sistemas é, também, o mais cínico dos sistemas. Não perdoa quando é maltratada, vilipendiada, agredida – e sabe vingar-se.

Durante décadas andámos a dar cabo da democracia. Desresponsabilizámos governos. Permitimos a emergência de centros de poder que ninguém conhece, ninguém controla, ninguém elegeu, mas mandam mais do que os titulares democraticamente eleitos. Assistimos pacificamente à perversão de modelos. Ao avanço desregulado da globalização. Ao desrespeito pela dignidade humana. E as pessoas, os cidadãos, no exercício da pouca cidadania que lhes resta resolvem dizer “não”, basta.

Escolhem quem lhes diz que o que existe não serve e que é preciso algo diferente. Não lhes importa em que consiste esse diferente, desde que seja diferente do que existe. E quando são chamadas a votar, votam contra o sistema. Contra o presente. Contra as formas de vida que lhes impuseram. Em França, escolhem Le Pen. Em Espanha, escolhem o Podemos. Em Itália, votam num palhaço. Na Grécia, escolhem o Syriza. Em Portugal, o BE. Na Holanda, a extrema-direita. Na Alemanha, o Alternativa pela Alemanha. Claro que a onda tinha de atingir os Estados Unidos. Donald Trump serviu para essa finalidade. Não interessa se são de esquerda, de centro ou de direita. São populistas porque dizem o que as pessoas querem ouvir. E as pessoas confiam-lhes o voto. Essencialmente para dizerem que não querem o que está.

Com Trump, a América fica mais imprevisível e o mundo fica mais perigoso e menos seguro. De facto, raramente a agenda dos candidatos vencedores coincide com a agenda dos Presidentes eleitos. Com Trump não deverá ser diferente. Mas a dúvida tem de se manter e a preocupação tem de subsistir. Não são dias de sol radiante que se anteveem no horizonte – como não o seriam, diga-se em abono da verdade, se Hillary tivesse ganho as eleições.