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Desafio da inovação leva sociedades de advogados a apostar em ESG e fintech

Escritórios que operam em Portugal veem a sustentabilidade como oportunidade de destaque perante a concorrência e o trabalho híbrido como fonte importante de atração e retenção de talento.
19 Fevereiro 2022, 20h00

As maiores sociedades de advogados em Portugal têm investido na inovação tecnológica, de recursos humanos, processos e modelos de trabalho há vários anos, mas o conceito começa agora entrar a “baby steps” nos escritórios de média dimensão, que se querem posicionar como referência em temas e tecnologias que ainda poucos dominam com qualidade. Quem esteve na dianteira mantém-se a atualizar programas informáticos, a renovar sedes, a incitar à requalificação e junta agora novos alvos, como os critérios ESG (environmental, social e corporate governance), a blockchain e as fintechs.

A Chief Operating Officer (COO) da Abreu Advogados crê que a inovação não pode ser dissociada do desenvolvimento tecnológico, para criar maior valor junto dos clientes, ter mais organização na equipa e gerar eficiência interna, mas ao mesmo tempo tem procurado piscar o olho às áreas dos pagamentos digitais e da sustentabilidade ambiental, social e de governança. “Temos como objetivo ir cada vez mais ao encontro das necessidades dos nossos clientes pelo que organizamos as nossas equipas de forma a podermos ser uma mais-valia em todos os projetos que trabalhamos. Assim, as nossas equipas têm trabalhado para focar-se em sectores de indústria e na combinação de competências que possam ajudar a ultrapassar os problemas cada vez mais desafiantes e cross border que os clientes enfrentam, e que exigem uma abordagem flexível e integrada, como acontece por exemplo na área de ESG ou das fintech”, exemplifica Matilde de Mello Cabral. “Todo o conhecimento que é produzido em cada trabalho que desenvolvemos é depois sistematizado e partilhado com o apoio de equipas multidisciplinares de advogados e de Gestão do Conhecimento, permitindo a constante atualização e enriquecimento dos projetos que integramos ou desenvolvemos”, explica a COO da Abreu ao Jornal Económico (JE).

A PLMJ começou o ano com a recondução do atual conselho de administração – liderado por Bruno Ferreira e Luís Pais Antunes (co-managing partners) – para o triénio de 2022-2024, depois de uma assembleia de sócios que lhes deu mais um mandato na gestão da qual estão à frente desde setembro de 2018, sendo que Luís Pais Antunes reformar-se-á em 2023. Ainda que os rostos não tenham sido refrescados naquela que é uma das maiores sociedades de advogados do país, reformados foram os focos de trabalho. Se em 2021 a PLMJ lançou a nova área de prática transversal a que chamou de “Responsible Business (“Negócio Responsável”), o plano estratégico da PLMJ para 2022 dá agora uma ênfase (ainda mais) especial ao tema da sustentabilidade, pelo fator de diferenciação perante os rivais. “É uma das grandes apostas para este ano. Aporta uma abordagem ESG à generalidade dos desafios que os nossos clientes nos colocam.

Depois de uma pandemia de dois anos que levou à existência de um Plano de Recuperação e Resiliência, que é todo perpassado pelo tema da sustentabilidade, o movimento que as empresas já estavam a fazer em direção a um desígnio global – pelo menos nas economias desenvolvidas – acelerou, vai consolidar-se e é algo que não podemos saudar mais”, esclarece ao JE fonte oficial. Segundo a PLMJ, “a atividade empresarial está sujeita a um número crescente de exigências que obrigam os gestores a expandir consideravelmente o seu âmbito de visão” e que “resultam da pressão exercida por investidores, consumidores, trabalhadores e governos no sentido de que as empresas devem considerar um conjunto de outros interesses para além da maximização do lucro acionista e são enquadradas ao nível ESG”. Logo, “esta nova realidade cria um amplo conjunto de riscos adicionais que poderão resultar em impactos negativos substanciais, nomeadamente em termos de responsabilidade legal, danos reputacionais e perda de negócio”.

Em meados de janeiro, a sociedade de advogados RRP – que faz parte da rede de escritórios jurídicos da EY – recrutou Tiago Aires Mateus, presidente da comissão de vencimentos da TAP e administrador da gestora do Hospital da Cruz Vermelha, como sócio para liderar a nova área de prática de Operações Jurídicas (“Legal Operations”), que procura assessorar as empresas na due diligence e no cumprimento das suas obrigações societárias e regulatórias, envolvendo mais processos tecnológicos e dados.

Já a Vieira de Almeida (VdA) tem um histórico de pelo menos uma década de inovação, sendo que o ímpeto aconteceu nos últimos anos. Em 2019, a VdA organiza o primeiro Legal Hackathon em Portugal, um evento normalmente associado a maratonistas da programação, mas desta vez envolvendo desafios jurídicos, aos quais os participantes tinham de saber responder ao longo de um fim de semana de trabalho em equipa. No primeiro ano da pandemia, a sociedade reestruturou a sua rede de inovação interna e externa e esteve novamente na lista das mais inovadoras da Europa continental do jornal britânico “Financial Times”, nomeadamente por, ao longo de três semanas e com uma equipa multidisciplinar com a Católica Lisbon School of Business & Economics e com a tecnológica portuguesa Bi4all, ter criado a I-Dial, uma plataforma digital – à base de inteligência artificial – que cuja missão era ajudar idosos que, devido à Covid-19, se encontrassem em isolamento. Mais recentemente, no passado mês dezembro, a sociedade liderada por Paula Gomes Freire decidiu dar o salto e implementar um modelo de inovação aberta e em rede (commumente designada de “open innovation”), através de um site em que é possível consultar todas as atividades promovidas pela firma nesta área. “Com a inovação no seu ADN, a VdA quer potenciar a partilha e a colaboração com os clientes e stakeholders e acredita que esta aposta permitirá reforçar e potenciar o desenho de novas soluções, potenciadas pela tecnologia, assente numa relação de estreita cocriação”, justificou a VdA no lançamento da VdA Inovação, que trabalha em três vertentes: novos serviços jurídicos, serviço e tecnologias de vanguarda.

José Luís Arnaut recorda ao JE que a CMS desenvolveu, no ano passado, uma plataforma digital inovadora dedicada ao trabalho jurídico colaborativo, cuja aplicação pode ser obtida em sistemas operativos iOs e Android, a Lupl, que ficou a funcionar em novembro e integra ferramentas mundialmente conhecidas de trabalho como Microsoft Teams, Zoom, Google Drive, Slack, iManage, Net Documents, SharePoint, OneDrive ou DocuSign. “Este será o ano de afirmação e implementação desta plataforma, que tem por objetivo tornar mais fácil para clientes e advogados trabalharem em conjunto de um modo mais eficiente. Não substitui os sistemas existentes, antes congrega-os num espaço único, com toda a segurança e com o objetivo de dar, em tempo real, uma overview 360 de todos os assuntos, esteja a trabalhar no escritório, em casa, no café ou em viagem. Este significativo investimento da CMS foi levado a cabo em pareceria a Cooley e a Rajah & Tann Asia, que também estiveram na génese desta ferramenta inovadora”, explica o managing partner da CMS Rui Pena & Arnaut. Todavia, o advogado reconhece que a Lupl é apenas um exemplo de uma iniciativa da sociedade internacional no campo da inovação. “No fundo tem um objetivo claro: tornar mais fácil para clientes e advogados trabalharem em conjunto de um modo mais eficiente”, sintetiza. “A inovação não é um fim em si mesmo, mas existe para servir um propósito: ajudar os nossos clientes a atingir os seus objetivos. Acredito que são as ações client oriented que tornam uma Sociedade inovadora, sejam elas quais forem”, diz José Luís Arnaut.

Por sua vez, a Miranda está a reforçar as ferramentas de gestão financeira, de recursos humanos e de colaboração, pois considera-as fundamentais para manter o regime de trabalho híbrido. É disso exemplo o M-Flex, implementado em 2021 “como solução de longo prazo para o mundo pós-pandémico que a Miranda pretende aprofundar ao longo de 2022 e para o futuro”, conta Ricardo Alves Silva, sócio e membro do conselho de administração da sociedade, afirmadamente convictos de que a flexibilidade laboral é fonte de atração e retenção de talento, mais capacidade produtiva e maior bem-estar. Para o administrador, um escritório verdadeiramente inovador em 2022 não tem barreiras físicas ou geográficas para nenhum dos profissionais. “E não se limita a copiar o que os outros fazem para tentar tornar os seus colaboradores mais eficazes. Tão, ou talvez mais, importante é evoluir de forma a ir ao encontro das necessidades dos seus clientes – que estão em constante mudança – e, se possível, antecipar as mesmas. Num mundo cada vez mais competitivo, só quem conhece a fundo a atividade dos seus principais e potenciais clientes poderá antecipar as suas necessidades e, assim, manter a sua posição de relevância”, garante Ricardo Alves Silva ao JE.

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