Esta semana um alto responsável associativo empresarial, acossado por uma bastonária, não hesitou em descartar eventuais falhas comportamentais institucionais e apontar a eventuais actos individuais de trabalhadores a quem teriam que ser assacadas responsabilidades. Num repisar, clássico e ad nauseam, dos actos dos soldados a desresponsabilizarem os generais.

As longas noites de Verão deram-nos também a oportunidade de ler as mais de quatro mil páginas de uma dada acusação. A ser provada a tese do Ministério Público, o que está longe de ter acontecido e que caberá aos tribunais, percebe-se a desfaçatez de montar comunicações codificadas, uma sala de mercados paralela (à oficial) e clandestina, e uma prática de desvio de poupanças de milhares de aforradores em favor de um punhado de indivíduos.

Estes mesmos personagens que não se coibiram de arruinar largos milhares de famílias e trabalhadores. Uns e outros escolheram uma dada instituição financeira, mais que centenária, de entre as múltiplas alternativas, para nela aforrarem ou trabalharem. A julgar pelo que consta na referida acusação, a dedicação, empenho e lealdade de clientes e trabalhadores foi destruída por um punhado de gangsters.

Acolitados por uns gananciosos, que se prestaram a executar o plano de quem tudo sabia. Gananciosos que receberam prebendas, amiúde em jurisdições offshore e não raras vezes tendo como destinatários fictícios pais reformados e filhos menores, todos eles alegados prestadores de serviços de consultoria.

E que dizer do antigo CEO de uma operadora de telecomunicações que promoveu a venda da sua subsidiária mais lucrativa, a aquisição de uma outra em termos ruinosos, a aplicação de excedentes de tesouraria em papel comercial de entidades falidas, tudo e mais alguma coisa, até que a empresa fosse desmantelada e vendida a capital estrangeiro especulativo. Não passou despercebido, contudo, que o mesmo CEO teria recebido uns valentes milhões de euros, em contas offshore, liberalidade de um dado acionista, a troco de uma suposta fidelização dele e de uns alegados quadros superiores.

As instituições desaparecem pela falta de ética, pela sensação de impunidade de quem lidera e pela complacência dos que deveriam funcionar como contrapeso, e que são tornados cúmplices.

Não foram os clientes insatisfeitos, os produtos obsoletos ou tecnologia menos adequada que estiveram na origem da queda de gigantes como a Enron, Pan Am, PT ou BES. Foi a ganância de uns e a cumplicidade de outros. Um punhado deles bastou.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.