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Desemprego: José Luís Livramento com leitura diferente dos dados do INE

Para o engenheiro e PhD em economia, as diferentes análises sobre os números do desemprego em Cabo Verde, divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística, se devem ao facto de o organismo que faz a recolha dos dados utilizar “uma metodologia simplificada”, cujos resultados tendem a “não serem sentidas como reais”. Saiba mais.
8 Abril 2018, 09h29

A posição critica de José Luís Livramento em relação à metodologia que é utilizada pelo INE vem desde o seu livro “Cabo Verde, de uma economia de renda para um modelo de economia sustentável”, lançado em 2013. Razão pela qual o Económico Cabo Verde o procurou para comentar os recentes e polémicos dados sobre o desemprego no arquipélago – baixa de 15 para 12,2% – aplaudidos pelo Governo, mas visto pela oposição como irreais por causa do aumento do número de cidadãos inactivos, ou seja, que desistiram de procurar trabalho.

O gestor, com PhD em Economia, começa por afirmar que persistem grandes dúvidas sobre esta modalidade porque o INE introduziu standards de países avançados na contagem da população activa e dos desempregados, que, a seu ver, não são comparáveis. Desde logo, pela existência de uma alta taxa de economia informal no país.

O economista explica que, pela metodologia da contagem da taxa de atividade e, em consequência, da inactividade, se basear num método bastante simplificado leva muitas vezes a análises variadas em relação aos seus resultados. “Basta que o inquerido responda que nas últimas quatro semanas não procurou trabalho para ser considerado inactivo, dando azo à análise sobre os chamados desencorajados. E para a contagem do emprego, basta dizer que trabalhou uma hora num determinado período, introduzindo a questão da precariedade”.

José Luís livramento defende que se deve “reanalisar este mecanismo que coloca dúvidas em toda a parte do mundo, inclusive em países onde os dados de inquéritos são cruzados com os dados dos Centros de Emprego. Em Cabo Verde, não existe a cultura de se ir aos muito poucos Centros de Emprego para se inscrever, porque o subsídio de desemprego é ainda recente e de montante bastante limitado”.

E dá como exemplo um estudo dos investigadores Frederico Cantante e Renato Miguel do Carmo, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do Instituto Universitário de Lisboa, que conclui que, no Terceiro Trimestre de 2017, em Portugal, o desemprego real seria de 17,5% e não os oficiais 8,5%.

Nesta perspetiva de análise de metodologia, “estes dados podem não ser sentidos como reais” e “levanta leituras diferenciadas”, acrescenta o economista, justificando deste modo os motivos pelos quais têm surgido análises díspares da parte da classe política, “algumas vezes aceitando os números do INE, outras não”.

Frisa que esta é uma desconsideração grave por uma instituição como o INE pois todos aceitaram a metodologia, inclusivamente, as organizações internacionais com voto na matéria e este tem aplicado a mesma de modo coerente. O facto de não concordar totalmente com a metodologia e com o prazo anual da sua aplicação, não dá direito a esta posição de “hora para cima, hora para baixo, como o interruptor de electricidade”, ironiza.

Lembra que foi com base nesta metodologia hoje utilizada que foram recalculados a taxa de desemprego de 2000, passando a 8,6% e de 2010, que passou a 10,7%. Indo mais longe nos exemplos, analisando a série de dados sobre o desemprego editados pelo INE, conclui por uma certa coerência entre aquilo que aconteceu em 2011, que é a data em que o País teve uma taxa de desemprego equivalente pois os indicadores do mercado de trabalho também são equivalentes”.:

“A taxa de desemprego de 2017 é igual a de 2011, 12,2%. A taxa de atividade em 2011 é de 59,1 %, em 2017 59,2% e a taxa de inatividade em 2011 é 40,9% e em 2017 40,8%. O crescimento económico, do PIB, de 2011 é de 4% e o de 2017, também à volta 4%. Aqueles que em 2011 cantaram de galo com estes números agora deveriam reconhecer os de 2017 por que é a mesma metodologia e os resultados são equivalentes”, observa Livramento.

Acrescenta que uma outra coerência do trabalho do INE reside no facto de, enquanto a economia navegava num crescimento raso abaixo de 1% (2012 a 2014), a taxa de desemprego andou à volta dos 16%, caindo para os 12,2 % quando a economia cresce a 4%.

“Uma vez que a taxa de inatividade em 2017 é igual a de 2011, não é por aí que se vai descredibilizar os dados, mas sim eu iria mais atrás da metodologia e o prazo de recolha dos dados do mercado de trabalho” conclui o economista.

Por isso defende que há que fazer luz sobre estas metodologias de recolha de dados de mercado de trabalho para haver um consenso à volta disso. Diminuir o período de recolha, que tem sido feito de ano a ano, para pelo menos de seis em seis meses até se chegar a dados trimestrais, poderia, na perspetiva de Livramento, possibilitar uma análise mais coerente destes números, nomeadamente, pela captura de sazonalidades.

Desemprego jovem preocupa

Ao analisar os dados, José Luís Livramento centra a atenção no desemprego jovem, o de longa duração e os que têm formação e não conseguem emprego.  De acordo com os números do INE, o desemprego jovem teve uma queda substancial, 8,6 pontos percentuais nos indivíduos entre 15 e 24 anos, e de 11.3 pp na faixa entre 25 e 34 anos. Mas, permanecendo ainda bastante elevado, o que, no entender de Livramento, deve ser a principal preocupação do governo. “Para tirar vantagens do dividendo demográfico, Cabo Verde tem de integrar melhor os jovens no mercado de trabalho”.

No geral, de acordo com o Economista José Luis Livramento, o número de inativos e a consequente taxa de inatividade, “é bastante elevado, indicando que, não só não estamos a aproveitar o dividendo demográfico, como também, não há optimização da força do trabalho. Tem muita gente com força de trabalho, mas que não contribui para a produção, para a economia, devido ao desemprego.”

“Quando os dados do INE apontam que mais de metade dos desempregados tem o nível secundário e que 11,7 % tem formação superior, é preciso refletir sobre a relação da formação com as necessidades do mercado de trabalho”, afirma José Luís Livramento.

E faz notar que a taxa de pessoas com formação desempregadas é na área das ciências sociais. “Mas quando vai para as áreas científicas e tecnológicas que exigem aptidão a nível do trabalho com as matemáticas e ciências de computação, há uma menor procura dos cursos e isso acaba por resultar num desencontro no mercado de trabalho entre a procura e a oferta, parte do problema de emprego em Cabo Verde”, indica.

Segundo Livramento, em termos de região há uma melhoria porque os concelhos que estão abaixo da média nacional de 12,2% de desemprego são apenas 6 em 22, mas nota que é preciso estar atento ao facto de os centros urbanos como Praia e Santa Catarina de Santiago, continuarem com taxas acima da média dos 12,2%, chegando a 16,9%. Essa disparidade “pode ser explicada pelas assimetrias económicas que levam as pessoas a procurar os centros urbanos com as maiores potencialidades de emprego, principalmente, em ano de seca”, explica.

“Há uma clara correlação entre estas duas áreas, crescimento económico e diminuição do desemprego, e há estudos concretos realizados pelo FMI que provam isso, é só ver o Economic Outlook de Outubro de 2012”, sugere, referindo ao mesmo tempo que “o crescimento de um ponto percentual da economia nos países em desenvolvimento leva a um aumento da taxa de emprego de 0,2 pontos percentuais, enquanto um ponto percentual de crescimento da economia nos países desenvolvidos levam a um crescimento de emprego de 0,49% ponto percentual. Este resultado explica o facto de, nos países avançados, um crescimento do PIB acima dos 2% começa por ser satisfatório para certos agentes políticos”.

José Luís Livramento entende que deveria existir um consenso à volta da meta de crescimento sustentável dos 7% como principal objetivo económico, pois só assim se poderá controlar um grande mal nacional, eliminando a prazo o desemprego estrutural, chegando mesmo a uma taxa de desemprego residual.

“Se precisamos de crescimento de 7% e estamos a crescer a 4%, quer dizer que precisamos de melhorar as políticas económicas e sociais de modo a ter uma diminuição do desemprego”, opina o economista, para quem um crescimento de 7% é um desafio necessário, mas nada fácil, isso tendo em conta que o país vem de uma taxa de crescimento persistentemente raso, estando-se, assim, longe dos fundamentais que levarão à redução substancial do desemprego.

Foto: Inforpress

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